sábado, 9 de março de 2024

OS PERIGOS DA AVAREZA

 


Lucas 12.13-21

Segundo matéria divulgada no portal da CNN Brasil[1] (www.cnnbrasil.com.br), o número de milionários no Brasil subiu de 293 mil para 413 mil do ano 2021 para 2022. Considera-se milionário quem tem patrimônio acima de US$ 1 milhão. Já em termos globais, o número de milionários no mundo era de 59,4 milhões ao final do ano 2022.

Nas redes sociais e diversos canais de internet é comum nos depararmos com anúncios de especialistas se dispondo a nos fornecer ensinamentos para nos tornamos milionários. A quantidade de ofertas é bastante grande, cabendo lembrar também que há livros publicados com esse mesmo tema.

O sonho de ficar rico faz parte da vida de muitas pessoas. Algumas têm esperança de ficar ricas ganhando na loteria; outras acreditam que trabalhando arduamente conseguirão aumentar seu patrimônio até o ponto de serem consideradas ricas; há as pessoas que se dispõem a práticas ilícitas por causa do dinheiro; enfim, a riqueza é almejada e buscada por muita gente.

Em nome da acumulação de bens materiais, muitas pessoas abrem mão de coisas preciosas, como a convivência com a família, com os amigos, momentos de lazer, a comunhão com Deus, o descanso, o cuidado com a saúde, etc.

Na passagem lida, Jesus estava ensinando à multidão quando um homem veio até Ele pedindo que Ele fosse árbitro em partilha de herança. O homem queria receber sua parte em uma herança e sua intenção era que Jesus ordenasse ao outro herdeiro que fizesse a divisão (v. 13).

O assunto trazido pelo homem não tinha absolutamente nada a ver com o que Jesus estava ensinando. Ficou evidente que aquele homem não estava ali com interesse nas coisas celestiais, pelo contrário, sua cabeça estava voltada para bens terrenos. Sua preocupação com uma herança era suficiente para que ele interrompesse Jesus tentando que Ele resolvesse o seu problema financeiro com o irmão.

A resposta de Jesus foi curta e incisiva: “homem, quem me constituiu juiz ou partidor entre vós?” (v. 14). Jesus não permitiu que aquela conversa se prolongasse, mas tratou de deixar bem claro que Ele estava tratando de valores espirituais, e não de valores terrenos, e que as coisas deste mundo não podem receber mais atenção do que as coisas celestiais, porque são transitórias.

Jesus declarou que “a vida de um homem não consiste na abundância dos bens que ele possui” (v. 15), ou seja, quando o assunto é o Reino de Deus, nada importa a situação financeira do ser humano, pois o seu valor não é demonstrado pelo que possui, mas pelo que ele é e faz ao longo de sua existência.

Para ensinar ao homem e à multidão qual seria a visão correta de um discípulo de Cristo, Ele contou uma parábola sobre um homem rico que obteve uma grande produção em sua lavoura, mas que demonstrou uma atitude totalmente equivocada em relação à riqueza, algo que é reprovado por Deus.

Jesus usou a palavra avareza para designar o apego a bens materiais em detrimento de coisas mais importantes, como a vida espiritual. É comum associarmos a avareza à mesquinharia. Chamamos de pão-duro quem não abre a mão para dispor de algum dinheiro em favor de alguém ou que pratica uma economia que não permite nem mesmo a ele próprio desfrutar dos benefícios que sua situação patrimonial poderia lhe proporcionar.

O avarento tem amor ao dinheiro, aos bens materiais, e esse amor acaba sendo a raiz de todos os males, com o perigo de provocar um desvio da fé e trazer inúmeros sofrimentos, como nos adverte o apóstolo Paulo em 1 Timóteo 6.10.

De acordo com o ensino de Jesus, a avareza traz alguns perigos muito reais, conforme vamos destacar a seguir.

 

     1)    DESENVOLVE O EGOÍSMO E O EGOCENTRISMO

O homem da parábola era rico, porém a sua riqueza não o tornou uma pessoa melhor, pelo contrário, ele demonstrou ser um homem egoísta e egocêntrico. Tudo o que esse homem fala está na primeira pessoa: meus frutos, farei, destruirei, construirei, meu produto, meus bens, minha alma.

O texto diz que ele “arrazoava consigo mesmo”, ou seja, ele estava tendo uma conversa com ele próprio. E após conjecturar sobre o que faria para estocar toda a abundância da produção obtida, concluiu que poderia dizer a si mesmo: “descansa, come, bebe e regala-te”.

Tratava-se de um homem que já era rico, e diante da enorme produção em suas terras, acabou ficando ainda mais rico. Então, a sua preocupação passou a ser a forma de armazenar e desfrutar de tamanha abundância.

Não havia nenhum problema no fato de aquele homem ser rico, assim como não seria pecado que ele fizesse planos para desfrutar do resultado de seu trabalho. É bênção de Deus podermos prosperar e usufruir daquilo que nos foi permitido por Deus conquistar.

Entretanto, é interessante notar que em nenhum momento aquele homem proferiu uma palavra de gratidão a Deus pela bênção da abundante colheita. Não se vê da parte dele nenhuma atitude no sentido de louvar a Deus e reconhecer que se Deus não o tivesse abençoado enviando chuva e sol nas épocas apropriadas, a lavoura poderia até mesmo não produzir nada.

Ele também não demonstrou a intenção de abençoar outras pessoas por meio do compartilhamento, da solidariedade. Havia, certamente, pessoas necessitadas em Israel, órfãos, viúvas, enfermos, porém ele não cogitou utilizar seus recursos econômicos para ajudá-los, para aliviar seu sofrimento.

Infelizmente, a sua avareza o levou a ser ingrato e demonstrar amor aos bens, mas não ao próximo. Os bens se tornaram o deus dele, e ele se fechou em seu mundinho perfeito de abundância material, porém afastado de Deus e das pessoas.

Embora estejamos diante de uma parábola, ou seja, uma pequena narrativa utilizada por Jesus para transmitir lições que tinham como finalidade ensinar verdades do Reino de Deus, podemos constatar facilmente que as histórias contadas por Jesus encontravam e ainda encontram eco na realidade do ser humano.

Em nosso mundo é comum ver pessoas que, devido ao amor ao dinheiro e a bens materiais, têm seus valores invertidos, valorizando o que é transitório e que não contribui para o seu crescimento espiritual.

O acúmulo de bens materiais tem a capacidade de despertar o egoísmo e o egocentrismo no ser humano, como aconteceu com o homem da parábola. Então, passamos a conjugar os verbos sempre na primeira pessoa: eu.

Com isso, vem a ingratidão, porque, a exemplo do agricultor da parábola, não nos lembramos de agradecer a Deus pelas bênçãos, antes, ficamos focados em nós mesmos e julgamos que os bons resultados alcançados são fruto apenas de nossa capacidade e nossa aplicação.

E, fechados em nosso egoísmo, não nos dispomos a utilizar essas bênçãos para abençoar outras pessoas. Pensamos apenas em como aumentar nosso patrimônio e protegê-lo. Nossas preocupações passam a ser em relação à forma de gerenciar tudo o que conquistamos, de maneira que a cada dia nos tornamos mais avarentos, mais apegados aos bens materiais, crendo que isso nos torna pessoas mais valiosas.

Jesus disse que a vida de um ser humano não consiste na grande quantidade de bens que ele consegue acumular. Entretanto, contrariando essa palavra, muitas pessoas gastam suas vidas correndo atrás de riquezas, de poder econômico ou político, de posições sociais elevadas, enfim, coisas que não têm valor aos olhos de Deus.

A avareza faz com que percamos de vista o que é realmente precioso, e com isto, caminhamos sem gratidão, esquecemos de Deus e ignoramos nosso próximo, justamente o que a Bíblia nos ensina a não fazer.

Na seção seguinte do texto Jesus vai dizer aos seus discípulos que devem buscar em primeiro lugar o Reino de Deus, não se preocupando com as coisas materiais, porque estas seriam acrescentadas pelo Altíssimo, que conhece todas as nossas necessidades. E Jesus conclui dizendo que “onde está o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração” (v. 22-34).

 

     2)    LEVA A NÃO CONSIDERAR O TEMPO E A MORTE

O que deveria ser uma bênção acabou se tornando um motivo de pecado. Diante de tanta fartura, aquele homem esqueceu que o ser humano é frágil e transitório, estando sujeito à morte. Ele também não considerou que ninguém conhece o tempo de sua morte, e que isso pode acontecer a qualquer momento, independente da idade da pessoa.

Com a ilusão de que teria muito tempo, ele passou a planejar que aquela produção extraordinária lhe garantiria sustento e tranquilidade por muitos anos. Ele imaginou que a riqueza o tornaria uma pessoa imune à passagem do tempo e à morte, e que não lhe sobreviria nenhum mal.

Isto pode ser visto no versículo 19: “¹⁹ Então, direi à minha alma: tens em depósito muitos bens para muitos anos”.

O homem da parábola estava envolto na ilusão de que seu grande patrimônio lhe traria segurança. Sua situação era a mesma descrita em Provérbio 18.11, que assim diz:

“¹¹ Os bens do rico lhe são cidade forte e, segundo imagina, uma alta muralha” (Provérbios 18:11)

E é exatamente assim que muitas pessoas pensam ainda hoje. Acreditam que a conquista de bens materiais lhes trará segurança, estabilidade, imunidade, superioridade, e que estarão completas, nada mais precisando.

Há os que desperdiçam suas vidas correndo atrás de riquezas. E quanto mais conseguem mais ainda desejam, como está dito em Eclesiastes 5.10: “¹⁰ Quem ama o dinheiro jamais dele se farta; e quem ama a abundância nunca se farta da renda; também isto é vaidade.” Eclesiastes 5:10

Pessoas assim perdem oportunidades valiosas de estar na presença de Deus, de usufruir de momentos alegres com seus familiares, de compartilhar experiências gratificantes com seus amigos, porque estão muito ocupadas amealhando bens.

Então Jesus quebra essa falsa expectativa com a afirmação de que “esta noite será pedida tua alma, e o que tens preparado, para quem será?” (v. 20). A Bíblia na versão King James Atualizada apresenta esse texto da seguinte forma:

“Contudo, Deus lhe afirmou: ‘Tolo! Esta mesma noite arrebatarei a tua alma. E todos os bens que tens entesourado para quem ficarão?’”

Jesus está deixando claro que nossa vida nesta terra não está sob nosso controle. Não temos a menor ideia de quantos anos viveremos, e nem mesmo se teremos um novo dia pela frente. Somente Deus tem o poder de nos manter vivos e de nos tomar deste mundo, e não recebemos um aviso prévio indicando qual será esse momento, pode ocorrer a qualquer tempo, quando menos estivermos esperando.

O homem da parábola estava em seu pleno vigor, fazendo planos futuros, mas Deus não fazia parte desses planos. Então, Deus disse que arrebataria a sua alma naquela mesma noite, e que tudo pelo que ele havia dedicado o melhor de sua vida ficaria para trás, não teria mais nenhum valor para ele.

Essa palavra deve nos levar a uma reflexão sobre a forma como temos conduzido nossas vidas. Deus nos presenteou com um corpo, com vida, saúde, condições de trabalhar e obter nosso sustento, família, descanso, momentos de lazer, capacidade de aprender e crescer, e principalmente nos concede a possibilidade de nos relacionarmos com Ele por meio de Jesus Cristo, experimentando um viver que vai na contramão dos valores deste mundo e que é capaz de nos tornar pessoas melhores, mais parecidas com Jesus, cheias de amor e aptas a impactar positivamente a vida de nossos semelhantes.

Precisamos ter sempre em mente essa verdade: nossa vida não pertence a nós, mas a Deus, e ele a toma de volta quando quiser. Deus não nos colocou neste mundo para sermos meros acumuladores, mas para vivermos de tal forma que Ele seja reconhecido e glorificado pelo mundo. Em vez de gastarmos nosso tempo correndo atrás do que é passageiro, devemos nos concentrar em desfrutar  do que Deus nos oferece, sendo sempre gratos ao Altíssimo pelo seu cuidado para conosco.  

 

     3)    FAZ ESQUECER QUE É NECESSÁRIO SER RICO PARA COM DEUS

Jesus concluiu sua parábola afirmando que é necessário ser rico para com Deus, em vez de buscar acumular riquezas deste mundo.

Ele disse isso em outra ocasião, conforme registrado em Mateus 6.19-21:

“¹⁹ — Não acumulem tesouros sobre a terra, onde as traças e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam; ²⁰ mas ajuntem tesouros no céu, onde as traças e a ferrugem não corroem, e onde ladrões não escavam, nem roubam. ²¹ Porque, onde estiver o seu tesouro, aí estará também o seu coração.” Mateus 6:19-21

Ser rico para com Deus e ajuntar tesouros no céu são a mesma coisa. A resposta está na sequência de Lucas 12, versículos 22-34, onde Jesus afirma que é necessário buscar em primeiro lugar o Reino de Deus.

Ajuntar tesouros no céu é ter as coisas celestiais como prioridade. É buscar a vontade de Deus acima da nossa. É viver com a consciência de que nossa existência não se resume a conquistas terrenas, mas deve servir para abençoar o nosso próximo, levar o conhecimento de Deus a quem ainda o desconhece, praticar o amor e a misericórdia, caminhar conforme os valores do Reino.

Como já dissemos, não é pecado ter bens materiais, dinheiro, pois isso pode vir como bênção de Deus para nossas vidas. A Bíblia registra servos de Deus que foram muito ricos, como Abraão, Jó, Davi, Salomão, etc. Suas riquezas foram fruto do agir de Deus, que os fazia prosperar e lhes proporcionava mais do que o necessário para que pudessem ter vida farta.

O grande problema está em se esquecer de Deus e mergulhar no relacionamento exclusivo com os bens materiais. Jesus disse claramente que não há possibilidade de servir às riquezas e a Deus, conforme narrado por Lucas:

“¹³ Nenhum servo pode servir a dois senhores; porque irá odiar um e amar o outro ou irá se dedicar a um e desprezar o outro. Vocês não podem servir a Deus e à riqueza.” Lucas 16:13

O homem da parábola estava servindo à riqueza. Ele não usava os recursos financeiros para atender às suas necessidades e do próximo, mas era um escravo de seu patrimônio, tornando-se egoísta e egocêntrico. Com isto, ele não tinha como servir a Deus, e, na verdade, talvez ele nem cogitasse em fazer isso, porque em nenhum momento ele menciona Deus enquanto está exultando com a enorme produtividade da lavoura e fazendo seu planejamento para o futuro.

Então, a parábola retrata muito bem a situação de uma pessoa que serve ao dinheiro, que tem o seu coração nas coisas materiais e não no Reino de Deus: ela se esquece de Deus, e passa a viver sem Ele.

E o fim de alguém que vive sem Deus é morrer sem Deus, algo extremamente triste e eternamente irremediável.

Por esta razão, enquanto Deus nos concede vida, devemos vivê-la como servos de Deus e não como escravos dos bens materiais, aproveitando nosso tempo para fazer o melhor em favor do nosso próximo e para buscar o aprimoramento espiritual, seguindo os ensinos de Jesus Cristo e amando a Deus em primeiro lugar.

Diferente daquele homem que, em meio à multidão que ouvia ensinamentos espirituais de Jesus, estava preocupado com a herança a receber, a nós cabe estarmos sempre sintonizados com Jesus, concentrados de todo nosso ser em seus ensinos e na prática de Sua Palavra.

Assim, seremos ricos para com Deus.

 

CONCLUSÃO

Embora o mundo valorize de forma extrema as riquezas materiais e ensine as pessoas a fazerem o que for necessário para amealhar patrimônio, Jesus Cristo vem nos ensinar a andar em sentido oposto, tendo a compreensão de que este mundo e tudo o que nela há vai passar, e que inclusive nós temos um tempo curto aqui na terra, que não deve ser desperdiçado correndo atrás do que é efêmero.

A Igreja de Cristo deve caminhar de forma diferente, mostrando ao mundo que não é escrava dos bens materiais, mas serva de Cristo.

Valorizemos o que realmente importa: o Reino de Deus, nosso relacionamento com o Altíssimo, os presentes que Ele nos dá nesta vida, como nossa saúde, nossa família, nossos amigos, nossos irmãos na fé.

A Bíblia nos ensina que todo ser humano um dia terá a sua existência neste mundo cessada. Importará saber o que fizemos nesse tempo que o Senhor nos permitiu viver aqui. Como utilizamos nossos recursos espirituais, que são os dons recebidos do Espírito. E que uso fizemos dos recursos materiais que Deus nos proporcionou? Apenas os acumulamos ou utilizamos para abençoar outras vidas?

Que o Altíssimo nos dê sabedoria e capacidade para fazermos o que é certo e conforme os ensinos do Mestre Jesus.

José Vicente

28.1.2024


[1] https://www.cnnbrasil.com.br/economia/numero-de-milionarios-dobra-no-brasil-em-um-ano-e-chega-a-413-mil-mostra-relatorio/

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