quarta-feira, 24 de março de 2021

APRENDENDO COM A NEGAÇÃO DE PEDRO

 


Texto base: Marcos 14.27-31, 50 e 66-72

O Evangelista Marcos faz uma narrativa dos fatos que ocorreram nas 48 (quarenta e oito) horas que antecederam a morte de Jesus, sendo que no capítulo 14 encontramos (i) a unção feita por uma mulher em Betânia, (ii) a traição de Judas, e (iii) a negação de Pedro e demais discípulos. No capítulo 15 encontramos a narrativa do julgamento.

Sabemos que Pedro era um dos discípulos mais envolvidos com o ministério de Jesus, alguém que tinha maior proximidade com o Mestre, junto com João e Tiago, portanto era de se esperar que ele se mantivesse firme ao lado de Jesus durante aquele momento extremamente difícil, mas a realidade foi outra.

Quando pressionado, Pedro disse que não conhecia a Jesus, que não era seu discípulo e até chegou a ofender as pessoas que o indagavam.

Os outros discípulos simplesmente fugiram a abandonaram Jesus quando este foi preso e levado ao sumo sacerdote.

É natural que a narrativa apresentada provoque em nós sentimentos de reprovação à conduta de Pedro e dos demais discípulos. Afinal, entendemos que eles eram amigos de Jesus, contavam com Sua confiança, e no momento mais doloroso da vida do Mestre simplesmente desapareceram, abandonando Jesus nas mãos dos algozes.

O problema é que talvez não estejamos em condições de julgar e condenar aqueles homens por sua conduta, porque em seu lugar não sabemos se teríamos agido de outra forma.

O importante é que, ao lermos o relato do Evangelista Marcos, percebamos as lições que a Bíblia quer nos ensinar, pois, conforme escreveu Paulo na Segunda Carta a Timóteo: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça” (2 Timóteo 3:16).

O que podemos aprender com o relato feito pelo Evangelista Marcos?

 

     1)    Aprendemos que somos mais fracos do que pensamos

Quando Jesus disse a seus discípulos que eles o abandonariam, Pedro rapidamente disse que ele jamais se escandalizaria com o Mestre, e após Jesus lhe dizer que ele O negaria por três vezes, Pedro afirmou que de maneira nenhuma negaria a Jesus, e que se fosse necessário daria sua vida pelo Senhor. E os demais discípulos confirmaram que tinham essa mesma disposição (v. 27-31).

Todavia, assim que Jesus foi preso, Marcos narra que “deixando-o, todos fugiram” (v. 50). E depois, quando Jesus foi levado ao Sumo Sacerdote, Pedro foi reconhecido por algumas pessoas como discípulo de Jesus, mas veementemente o negou.

Causa perplexidade ver um homem que, poucos instantes antes, havia jurado fidelidade a Jesus, subitamente, ao ser pressionado, não titubeou em negar que tivesse algum vínculo com Jesus ou que ao menos o conhecesse. E os demais discípulos, que juntamente com Pedro haviam afirmado que se fosse preciso morreriam por Jesus, também sumiram diante do perigo.

Antes de condenarmos Pedro e os demais discípulos por sua atitude, precisamos refletir quanto à lição que essa passagem nos ensina com relação a nós mesmos. A narrativa de Marcos não foi incluída na Bíblia com o intuito de envergonhar aqueles homens, mas para servir de alerta para todos nós, discípulos de Jesus, que juramos fidelidade ao Mestre e acreditamos ser capazes de dar nossa vida por Jesus.

Essa passagem vem nos ensinar que somos mais fracos do que pensamos!

Quando Pedro e os demais discípulos afirmaram que se manteriam fieis a Jesus e que seriam capazes de morrer pelo Mestre, eles estavam sendo sinceros, pois acreditavam realmente que teriam capacidade para assim proceder. Todavia, Jesus os conhecia profundamente, e sabia muito mais de suas fraquezas do que eles próprios. Jesus os advertiu do que iria acontecer, mas eles não aceitaram, pois estavam convictos de que teriam condições de cumprir o que diziam.

Diante, porém, de uma circunstância que trazia perigo e causava temor, eles se viram fragilizados e não tiveram coragem de acompanhar o Mestre, fugindo apressadamente e negando a Jesus.

Jesus não ficou surpreso, pois os conhecia bem demais, porém eles devem ter se sentido extremamente confusos diante de tal situação, pois mostraram covardia justo quando deveriam ter sido corajosos. Abandonaram um companheiro justo no momento em que Ele precisaria do apoio de seus amigos.

Ali, eles entenderam que não eram tão fortes como pensavam. Que toda aquela confiança que tinham em si mesmos era vazia e enganosa, porque no fundo eram fracos e medrosos, fariam qualquer coisa para salvar suas próprias vidas.

A exemplo de Pedro e seus companheiros, podemos cometer o erro de confiar demasiadamente em nossa capacidade, em nossa força, considerando-nos mais fortes do que realmente somos e ignorando nossas fraquezas.

Não podemos condenar Pedro e os demais justamente porque somos como eles. Temos a mesma natureza, a mesma tendência de achar que somos autossuficientes e que agiríamos diferente deles naquela situação, mas a verdade é que faríamos a mesma coisa.

Com a narrativa registrada em Marcos, Deus nos confronta para que olhemos para nós mesmos e reconheçamos o quão fracos somos, fugindo do autoengano. Ainda que sejamos sinceros em nossas declarações de amor e fidelidade a Deus, jamais podemos ignorar nossas fraquezas.

Quando mergulhamos no autoengano, crendo que somos muito fortes e fieis, tendemos a desenvolver algo que desagrada sobremaneira a Deus: o orgulho, a soberba.

Reconhecer nossas fraquezas é alimentar a humildade. Acreditar que somos fortes e inabaláveis pode conduzir à arrogância e à queda.

“A soberba precede a ruína, e a altivez do espírito, a queda.” (Provérbios 16:18)

Deus quer que nos mantenhamos humildes e dependentes dEle. Para isto, é essencial reconhecermos que não somos fortes como gostaríamos, mas que temos muitas fraquezas, pois assim receberemos o sustento do próprio Deus, que nos fortalecerá para vencermos os desafios da caminhada cristã.

Paulo assim escreveu: “Porque, quando sou fraco, então, é que sou forte.” (2 Coríntios 12:10)

Quando reconhecemos nossa fraqueza, acabamos nos esvaziando do sentimento de autossuficiência, assumimos nossa dependência de Deus e nos abrimos à ação do Espírito Santo em nós, de maneira que o Poder de Deus se manifestará em nossa fraqueza, assim como acontecia com Paulo.

Se, porém, cultivarmos a crença de que somos naturalmente fortes, ignorando nossas fragilidades, certamente o poder de Deus não se manifestará plenamente em nós e por meio de nós, e será necessário que sejamos submetidos a um tratamento da parte do Altíssimo para que nossa autossuficiência seja extirpada e, enfim, possamos ser usados como instrumentos da glória de Deus.

 

     2)    Aprendemos que é possível negar a Cristo não apenas com palavras, mas também com atitudes

Naquele fatídica noite, Pedro pronunciou palavras de negação. Claramente afirmou que não era discípulo de Cristo e que não o conhecia. Brigou com as pessoas que diziam que ele era um dos seguidores de Jesus.

Os demais discípulos, porém, não negaram Jesus com palavras, mas com sua atitude. O versículo 50 informa que todos o abandonaram assim que Ele foi preso. Eles podem não ter sido arguidos por outras pessoas como foi Pedro, mas negaram a Cristo quando agiram de forma oposta ao que haviam afirmado ao Mestre, abandonando-o e fugindo para não sofrerem consequências por serem seus discípulos.

É possível que nossas palavras sejam de amor e fidelidade a Jesus. Talvez nosso falar seja agradável e coerente com as Escrituras. Pode ser que nossas orações sejam feitas com fervor e fé. Mas a despeito de tudo isso, existe a possibilidade de que nossas atitudes se constituam em verdadeira negação de nossa fé e, consequentemente, de Cristo.

Quando Jesus estava ensinando aos seus seguidores, disse-lhes que deveriam imitar os escribas e fariseus em seus ensinamentos, mas não em suas práticas diárias:

“Fazei e guardai, pois, tudo quanto eles vos disserem, porém não os imiteis nas suas obras; porque dizem e não fazem.” (Mateus 23:3)

De acordo com Jesus, os atos praticados por aqueles líderes religiosos eram egoístas, tinham a finalidade de se mostrar diante das pessoas e eram incompatíveis com o que ensinavam ao povo.

Por esta razão, precisamos estar sempre vigilantes, cuidando para que não venhamos a negar a Jesus com nossas atitudes, embora nossos lábios pronunciem palavras de louvor e adoração.

As pessoas ao nosso redor estão mais atentas ao que fazemos do que às nossas palavras. O nosso testemunho de vida fala mais alto do que as nossas declarações, porque se não houver coerência entre a fé professada e as atitudes do dia a dia, de certa forma estaremos negando que conhecemos a Cristo e que somos seus discípulos, embora tentemos dizer o contrário com nossos lábios.

Jesus disse: “Se me amais, guardareis os meus mandamentos.” (João 14.15)

O maior sinal de que amamos verdadeiramente a Jesus é guardar os seus mandamentos, ou seja, obedecer à Sua Palavra. A falta de coerência entre nossas declarações de fé e nossos atos é uma forma de negar a Cristo, porque estamos desobedecendo aos Seus mandamentos e agindo como se não o conhecêssemos.

 

     3)    Aprendemos que o arrependimento traz perdão e transformação

No versículo 72 o evangelista Marcos diz que após a terceira negação, tendo cantado o galo, Pedro se lembrou do que Jesus havia lhe falado e começou a chorar. Mateus e Lucas dizem que ele chorou amargamente (Mateus 26.75 e Lucas 22.62).

O choro de Pedro traduz o seu arrependimento, a dor que ele sentia por ter negado ao seu Mestre, a quem ele amava e por quem afirmara que daria sua vida. Ele havia caminhado por três anos ao lado de Jesus, aprendendo com Ele, compartilhando suas experiências. Havia visto maravilhas sendo feitas por Jesus e recebera, ele próprio, poder para operar sinais e anunciar o Evangelho. E, de repente, em um momento onde a vida de seu Mestre estava para ser ceifada, ele não conseguiu manter sua fidelidade e simplesmente negou ter qualquer envolvimento com Jesus.

Provavelmente a dor que Pedro sentiu foi muito grande quando percebeu que havia acabado de fazer aquilo que Jesus dissera que ele faria, embora ele tivesse afirmado que daria sua vida por Cristo. Quando é dito que ele chorou amargamente significa que a sua dor era enorme.

Entretanto, não se trata apenas de chorar pelo pecado cometido. A continuidade da história narrada nos Evangelhos e demais livros do Novo Testamento revela que tanto Pedro como os demais discípulos foram perdoados e transformados após a ressurreição de Jesus.

Aqueles homens nunca mais negaram a Cristo e à sua fé. Pelo contrário, eles foram perseguidos por serem servos de Jesus, e mesmo sendo presos, torturados e ameaçados continuaram a proclamar o Evangelho, anunciando que Jesus é o Caminho, a Verdade e a Vida.

Eles acabaram cumprindo o que haviam dito a Jesus, pois foram capazes de dar suas vidas pelo Mestre. Morreram por crerem em Jesus e por anunciarem-no como o Messias que era esperado, o Salvador em que está a vida eterna.

Sabemos que eles se arrependeram pelo pecado da negação pelo fato de nunca mais terem voltado a cometer o mesmo erro. Eles foram transformados e fortalecidos pelo perdão de Cristo e pelo Espírito Santo agindo em suas vidas.

Ao longo de nossas vidas podemos experimentar esse tipo de dor algumas vezes, quando magoamos pessoas a quem amamos, quando causamos dor a alguém, quando nossas atitudes ferem e provocam estremecimento de relacionamentos.

Assim também podemos sentir a dor que é causada pela prática do pecado, pela adoção de um estilo de vida que contraria a fé que professamos, mas é necessário que essa dor provoque arrependimento, ou seja, mudança de vida.

Da mesma forma que Pedro e os demais discípulos foram perdoados por seu pecado de negação, também nós podemos ser perdoados quando cometemos esse ou outros pecados e nos arrependemos verdadeiramente, abandonando a prática pecaminosa e buscando obedecer à Palavra de Deus.

Cabe ressaltar que não adianta chorar mas continuar a insistir na mesma prática pecaminosa. Isso não é arrependimento e não atrai o perdão de Deus. Pedro chorou amargamente, e após a ressurreição Jesus veio até ele, deixou evidente que o havia perdoado e o comissionou a ser Sua testemunha, da mesma forma que aconteceu com os demais discípulos que haviam fugido na noite em que Jesus foi preso.

O perdão de Jesus está disponível a quem se arrepende de seus pecados. Ele morreu na cruz justamente para que o perdão fosse derramado sobre nós e para que não passássemos a vida toda carregando o peso dos erros cometidos e do sentimento de culpa que isso gera.

Jesus restaurou Pedro, livrou-o de sua culpa e o transformou em um dos pilares da Igreja em seus primórdios. Jesus também restaurou os demais discípulos, de forma que o perdão os libertou da culpa e o Espírito Santo os capacitou a serem missionários que proclamaram o Evangelho em todo o mundo e deram suas vidas em prol do Senhor Jesus.

O mesmo perdão está disponível para nós, que erramos, pecamos e por vezes negamos a Cristo com nossas atitudes ou palavras. Jesus nos chama ao arrependimento para que sejamos libertados da culpa e possamos ser transformados pela ação do Espírito Santo, de maneira a sermos testemunhas fieis de Cristo neste mundo, onde é tão difícil viver de modo digno do Evangelho.

 

CONCLUSÃO

Nós não somos perfeitos e estamos sujeitos a errar, ainda que sejamos sinceros em nossas declarações de fé e amor a Jesus. Nossos erros, porém, não devem nos desestimular na caminhada cristã, não podem nos levar ao desânimo, porque Jesus nos estende Sua mão e concede Seu perdão quando nos arrependemos e nos dispomos a ser transformados.

Pedro fraquejou porque confiou em sua própria força, mas a partir do momento em que ele passou a viver firmado unicamente pela força que vem de Deus, ele se tornou um homem valoroso, um instrumento por meio do qual Jesus foi apresentado a milhares ou milhões de pessoas que também tiveram suas vidas transformadas.

Pedro e os demais discípulos superaram a tristeza do pecado da negação porque Jesus os perdoou. Eles puderam caminhar sem as redes de culpa que os enredavam. E pode ser que nossa caminhada esteja sendo muito lenta porque estamos arrastando redes de culpa.

Entreguemos a Jesus nossos medos, nossas fraquezas, nossos pecados. Busquemos o perdão que Ele nos dá e sujeitemo-nos à atuação do Espírito Santo para que nosso ser seja transformado e nós, a exemplo de Pedro e seus companheiros, consigamos ser instrumentos do Poder de Deus para salvação das pessoas que nos conhecem.

“a fim de viverdes de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado, frutificando em toda boa obra e crescendo no pleno conhecimento de Deus; sendo fortalecidos com todo o poder, segundo a força da sua glória, em toda a perseverança e longanimidade; com alegria, dando graças ao Pai, que vos fez idôneos à parte que vos cabe da herança dos santos na luz.” (Colossenses 1:10-12)

Que Deus nos fortaleça a cada dia. 

José Vicente.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

RESULTADOS DE UMA EXPERIÊNCIA PESSOAL COM DEUS



Texto base: Jó 42.1-6

 

INTRODUÇÃO

Jó era uma ótima pessoa, um crente fiel que recebeu elogios do próprio Deus, conforme vemos em Jó 1.8, que assim nos narra:

“Perguntou ainda o Senhor a Satanás: Observaste o meu servo Jó? Porque ninguém há na terra semelhante a ele, homem íntegro e reto, temente a Deus e que se desvia do mal.” (Jó 1:8 )

Portanto, aquele homem se destacava em meio a sua geração por sua integridade, por sem alguém que temia a Deus e procurava andar em Seus caminhos, dando um testemunho de fidelidade perante todos.

Apesar de todas essas qualidades, Jó ainda não havia passado por uma experiência mais profunda com Deus, de forma que o conhecimento que tinha era fruto do que havia aprendido de forma impessoal, conforme ele próprio reconhece em Jó 42.5: “Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te veem.”

A Bíblia na Nova Versão Internacional (NVI) traz esse texto da seguinte forma: “Meus ouvidos já tinham ouvido a teu respeito, mas agora os meus olhos te viram.” (Jó 42:5, NVI)

Obviamente a fala de Jó não significa que ele, literalmente, viu a pessoa de Deus, porque a Bíblia nos mostra que nenhum ser humano pode ver a Deus. Jó estava dizendo que, antes, o conhecimento que ele tinha de Deus era impessoal, fruto do que ele ouvira, mas agora ele havia tido uma experiência pessoal com o Altíssimo.

Muitos de nós temos um relacionamento com Deus que se baseia no que aprendemos na Bíblia, no que ouvimos, mas às vezes falta algo mais profundo, uma experiência pessoal que mexa com nossa estrutura de forma mais intensa, provocando um abalo e transformação.

Um encontro mais profundo com Deus pode acontecer em situações críticas, difíceis, como as tribulações que sobrevieram a Jó, ou quando buscamos sinceramente esse relacionamento em nosso dia a dia, e provoca alguns resultados que vemos no texto em análise.

     1)    PROVOCA O RECONHECIMENTO DA SOBERANIA DE DEUS (v. 2)

Jó era um homem que, obviamente, sabia que Deus estava acima dos seres humanos, mas ele ainda não tinha ideia do quão grande e poderoso era realmente o Altíssimo, e de como era impossível alcançar o entendimento de Deus.

Durante o período em que passou por severas tribulações, Jó havia apresentado diversos questionamentos, muitas indagações com relação ao que vinha acontecendo com ele, não compreendendo os desígnios de Deus e procurando encontrar justificativas para tudo aquilo.

Todavia, naquele turbilhão em que a vida de Jó havia se transformado, surgiu o momento em que Deus passou a responder e repreender tanto a Jó quanto a seus amigos, e essa experiência fez com que Jó compreendesse e reconhecesse que Deus é soberano e está no controle de tudo.

Em alguns momentos, enquanto fazia suas indagações e seus lamentos, Jó chegou a pensar que talvez Deus não estivesse vendo o seu sofrimento, mas Deus deixou claro que nada escapa à sua visão, Ele é onisciente, onipresente e onipotente.

Jó também achou que Deus não estava sendo justo com ele ao permitir que tanto sofrimento se abatesse sobre sua vida.

Porém, Jó entendeu que ninguém está acima de Deus, e que Ele não é limitado por ninguém. Descobriu que, uma vez que Deus tenha estabelecido algum plano, nada nem ninguém pode frustrá-lo. Jó compreendeu que cada palavra dita pelo ser humano é do conhecimento de Deus, e que nada fica encoberto aos olhos do Altíssimo. Que por pior que pareça a situação, Deus permanece no controle, e tudo acontece com a Sua permissão e com algum propósito. Que Deus não deve nada ao ser humano, e que pela fé é necessário aceitar os desígnios do Altíssimo e esperar nEle.

O ser humano é naturalmente questionador, e quando sobrevêm situações muito difíceis, que trazem sofrimentos, costuma questionar o próprio Deus, achar que está havendo alguma injustiça, que não merece passar por aquilo, que talvez Deus não esteja vendo o que está acontecendo, etc.

Paulo, escrevendo aos Romanos, deixou claro que o ser humano não tem condições de questionar a Deus:

“Mas quem é você, ó homem, para questionar a Deus? "Acaso aquilo que é formado pode dizer ao que o formou: ‘Por que me fizeste assim? ’ " (Rm 9:20, NVI)

Entretanto, o reconhecimento da soberania de Deus leva a deixar de lado os questionamentos, pois há a certeza de que Deus age em todas as circunstâncias e tem controle sobre tudo.

Paulo, apóstolo vocacionado por Jesus, passou por experiências bastante aflitivas, teve sofrimentos intensos, mas cada experiência dessas, em vez de afastá-lo de Deus e enfraquecer sua fé contribuiu para que ele crescesse e descansasse na soberania de Deus, visto que ele tinha a certeza de que nada foge ao controle do Altíssimo, e que em tudo Deus trabalho em prol de Seus filhos, conforme se vê em Romanos 8:28, que assim diz:

“Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito.” (Rm 8:28, ARA)

“Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam, dos que foram chamados de acordo com o seu propósito.” (Rm 8:28, NVI)

Deus é soberano e não necessita de nosso conselho, pois não temos nada a ensinar ao Altíssimo, pelo contrário, temos muito a aprender.

 

      2)    LEVA AO ESVAZIAMENTO DE SI MESMO (v. 3)

Quando Jó questionava Deus por sua situação ele se considerava sabedor de algo. Achava que seu conhecimento era suficiente para tentar entender ou explicar os desígnios de Deus.

Quando, porém, Jó ouviu a voz de Deus, ele se deu conta de que não era nada diante do Altíssimo, e que não podia nutrir nenhum sentimento de orgulho. Jó reconheceu que seu conhecimento era nada, e que ele não teria condições de debater com Deus ou questioná-lo.

Jó reconheceu sua ignorância, sua pequenez, sua ousadia, e adotou uma postura humilde, esvaziando-se de si mesmo para dar a Deus a glória que lhe é devida.

Durante nossa caminhada cristã precisamos ser vigilantes para que não ocorra de nos tornarmos pretensiosos, arrogantes, achando que temos muito conhecimento, que somos muito importantes. Por vezes o conhecimento que achamos que temos nos faz sentir superiores aos demais. Isso também ocorre com relação ao exercício de cargos, funções, pelo nível intelectual, profissão, situação financeira, etc., e pode causar a ilusão de superioridade quanto às demais pessoas.

Todavia, a humildade é um dos pilares da vida cristã, e se não a cultivamos devemos começar a fazê-lo o quanto antes, pois não temos motivos para nos vangloriarmos e nos julgarmos mais importantes do que realmente somos.

Jesus faz uma chamada a seus discípulos para o cultivo da humildade quando diz:

“Tomem sobre vocês o meu jugo e aprendam de mim, pois sou manso e humilde de coração, e vocês encontrarão descanso para as suas almas.” (Mt 11:29, NVI)

O Mestre Jesus nos deixou o maior exemplo de esvaziamento de si mesmo, para que nós possamos imitá-lo, conforme Paulo escreve na Carta aos Filipenses:

“Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz.” (Fp 2:5-8, ARA)

Jesus era igual ao Pai em sua divindade e poder, mas isso não fez com que Ele buscasse glória pessoal ou quisesse algum privilégio, pelo contrário, Ele se esvaziou e demonstrou humildade para nos mostrar que, se o Filho de Deus age com humildade, não há nenhuma razão para que nós, meros seres mortais, alimentemos uma visão em que damos a nós mesmos um valor superior ao que realmente temos.

Nosso país tem mais de duzentos milhões de habitantes. O que um indivíduo representa perto desse número? O planeta tem mais de sete bilhões de pessoas vivendo nele. O que sou eu diante de tão enorme quantidade de pessoas? Um pequeno pontinho em meio a uma multidão! A ciência diz que provavelmente existem dois trilhões de galáxias no universo, e que o número de estrelas é superior à quantidade de grãos de areia que há em nosso planeta. Olhando para nós, o que somos diante de tanta grandeza?

Agora, se o universo é tão gigantesco a ponto de nem se saber a sua extensão, que dizer dAquele que o criou? Quão grande e poderoso é o Criador? E quem somos nós perante o Criador?

Quando contemplamos a grandeza de Deus e de Sua criação, percebemos o quão pequenos somos e compreendemos que nosso conhecimento, perto de Deus, é absolutamente nada.

 

      3)    PROVOCA ARREPENDIMENTO (v. 6)

Quando Jó contemplou a Deus em meio à sua aflição e ouviu o que Deus lhe dizia, ele concluiu que era um pecador diante de um Deus Santo e Perfeito, o que o levou a se arrepender de ter tentado argumentar com o Altíssimo e de ter feito questionamentos.

As experiências que Deus nos permite ter com Ele, sejam por tribulações ou por nossa própria busca, devem nos levar ao arrependimento e ao quebrantamento, porque constatamos o quanto somos pecadores, cheios de defeitos, limitados em nossa capacidade de entendimento.

Arrependimento é algo pouco pregado hoje em dia, porque envolve o esvaziar-se de si mesmo, abrir mão de convicções contrárias à Palavra, reconhecer que não somos bons como pensamos nem temos qualquer qualidade que nos garanta algum privilégio diante de Deus em relação às outras pessoas.

O arrependimento é a declaração de que Deus está certo, de que Ele tem razão e nós estamos equivocados. É a declaração de que precisamos de Deus, pois sem Ele não temos condições de fazer absolutamente nada.

Arrependimento é o ato ao qual somos chamados pelo Evangelho e é essencial a quem deseja caminhar com Cristo. Esse era o cerne da pregação de João Batista:

“Naqueles dias, apareceu João Batista pregando no deserto da Judeia e dizia: Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus.” (Mateus 3:1,2, ARA)

Pedro também, a exemplo dos demais apóstolos, pregou a mensagem do arrependimento:

“Arrependei-vos, pois, e convertei-vos para serem cancelados os vossos pecados” (Atos 3:19, ARA)

E o próprio Jesus pregou o arrependimento:

“Depois de João ter sido preso, foi Jesus para a Galileia, pregando o evangelho de Deus, dizendo: O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho.” (Marcos 1:14,15, ARA)

Portanto, o arrependimento é uma das marcas de quem realmente teve um encontro com Deus, uma experiência mais profunda e transformadora, por meio de Seu Filho Jesus Cristo.

 

CONCLUSÃO

Todo aquele que se declara cristão mas que ainda nutre em seu coração questionamentos sobre Deus e seus desígnios, dúvidas quanto ao poder de Deus e à sua soberania, sentimentos de soberba, arrogância, ou que não experimentou nem experimenta o arrependimento por suas obras que desagradam a Deus, provavelmente ainda não teve uma experiência real e profunda com o Altíssimo.

O encontro com Deus, por meio de Jesus Cristo, deve trazer transformações em nossa vida, em nossa mente, em nossa perspectiva, de maneira que não vamos nutrir quanto a nós mesmos uma visão equivocada, achando que somos deveras mais importantes do que outras pessoas, mas antes, perceberemos o quanto somos pequenos e carecedores da misericórdia de Deus.

Que o Altíssimo nos permita ter experiências muito mais profundas com Ele e se revele a nós por meio de Seu Filho, Jesus Cristo, de maneira que sejamos tocados no íntimo de nosso ser e nada seja mantido no lugar, mas que ocorra uma transformação completa em nós, para que sejamos verdadeiros imitadores de Cristo.

José Vicente

06.02.2021