Jonas 1.1-17
A história de Jonas é bastante conhecida, não apenas no meio
cristão, mas mesmo entre os que não professam a fé cristã há quem saiba o que
aconteceu ao profeta que foi engolido por um grande peixe por ter desobedecido
a uma ordem do Altíssimo.
O problema é que apenas conhecer a história, sem
compreendê-la e sem extrair ensinamentos para nossa vida, não resulta em
benefícios. Paulo, apóstolo de Cristo, assim se referiu à finalidade das
Escrituras:
“Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino,
para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o
homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra.” (2Tm 3.16)
Portanto, a introdução da história de Jonas na Bíblia foi
permitida por Deus para que, por meio dessa narrativa, nós pudéssemos aprender
mais sobre o Deus, sobre nós mesmos e sobre a forma como devemos servir ao
Altíssimo.
Sabemos que Jonas recebeu uma ordem de Deus: ele deveria ir
até a cidade de Nínive e clamar contra ela, visto que Deus haveria de
destruí-la por causa de sua iniquidade. Todavia, Jonas partiu para outro lugar,
tentando fugir da presença de Deus, e embarcou em um navio rumo à cidade de
Társis, pensando que conseguiria se esconder do Altíssimo.
Jonas cometeu um ato de desobediência. Ele era um profeta do
SENHOR e, como tal, é óbvio que deveria seguir à risca as ordens dadas por
Deus. Entretanto, nesse caso específico, Jonas simplesmente não queria cumprir a
determinação do Altíssimo, porque envolvia uma pregação que poderia levar ao
arrependimento justamente o povo que era inimigo de Israel: os ninivitas.
A cidade de Nínive era a capital do império assírio. Seu
povo era cruel e Israel já havia sofrido em suas mãos. Jonas não tinha o menor
desejo de ver a misericórdia de Deus derramada sobre aquela povo, antes, ele
queria que eles fossem destruídos.
Quando Deus ordenou que ele fosse pregar na cidade, sabia
que isso poderia trazer arrependimento aos ninivitas e então a misericórdia de
Deus seria manifestada sobre eles, e isso o incomodava muito. Ele considerava
que eles não eram dignos da Graça de Deus, que deveria ser reservada apenas a
Israel.
A postura desobediente de Jonas trouxe muitas repercussões,
e com o que é narrado na Bíblia podemos extrair algumas lições importantes para
nossas vidas.
1) Nossas atitudes repercutem na vida de outras pessoas (v. 4)
Quando Jonas embarcou no navio para Társis, certamente não
pensou que a sua atitude poderia trazer alguma consequência para as pessoas que
se encontravam naquela embarcação, e parece que ele até mesmo desconhecia a
onipresença de Deus, pois considerou que poderia fugir da Sua presença indo
para longe.
Subitamente, o mar se tornou revolto e uma forte tempestade
ameaçava naufragar o navio. Todas as pessoas que ali estavam corriam risco de
morrer, pois o texto bíblico diz que a embarcação estava a ponto de se
despedaçar, e caso isso acontecesse, o afogamento daquelas pessoas seria
inevitável, já que dificilmente conseguiriam nadar até terra firme em um mar
tão tempestuoso como aquele.
No caso de Jonas, o pecado da desobediência acarretou grande
risco às vidas de centenas de pessoas que não tinham nada a ver com o que ele
havia feito, mas que poderiam ser atingidas pelas consequências danosas de sua
rebeldia.
Igualmente, nossas atitudes são capazes de provocar
consequências nas vidas das pessoas ao nosso redor, e por isto é necessário que
sejamos prudentes e sábios em nosso viver, pois não somos apenas nós os
atingidos por nossas ações ou omissões.
Nós vivemos em sociedade, estamos sempre nos relacionando
com as pessoas, temos vínculos familiares, sociais, e constantemente precisamos
tomar decisões, seja para praticarmos alguma ação ou para deixarmos de fazer
algo.
O que decidimos pode impactar outras vidas. Por exemplo,
quando um dos cônjuges cede à tentação e se permite a prática do adultério, esse
pecado vai trazer consequências ao outro cônjuge, aos filhos, aos demais
familiares, e poderá resultar em destruição daquela família, com sofrimento a
todas as pessoas envolvidas.
Quando se trata de igreja, a situação não é diferente, pois
a Bíblia nos ensina que a Igreja é o corpo de Cristo, e nós somos os membros
desse corpo. As Escrituras são bastante claras ao ensinar que, se um membro do
corpo está enfermo, todo o corpo sofre com ele.
“De maneira que, se um membro sofre, todos sofrem com ele;
e, se um deles é honrado, com ele todos se regozijam.” (1Co 12.26)
Por vezes um ato pecaminoso que, em princípio, parece
pequeno, traz consequências terríveis ao corpo. Uma fofoca é suficiente para
prejudicar a unidade do corpo, gerando discórdias e divisões na igreja. Uma
mentira pode destruir relacionamentos. Uma crítica pode abalar a fé de uma
pessoa que não está firme.
E não são apenas as condutas comissivas que geram essa
repercussão, mas também as omissões. Quando deixamos de fazer o que deveríamos
também provocamos repercussões nas vidas das pessoas. Isso acontece, por
exemplo, quando vemos um irmão cometendo um erro e simplesmente nos calamos,
não fazendo nada para que ele possa mudar sua forma de agir. Essa nossa omissão
traz danos ao próximo, porque Deus poderia nos utilizar como instrumentos para
impedir o pecado na vida dele.
O cristão é chamado para ser bênção onde estiver, mas quando
age em desobediência, pode se tornar um canal de maldição, pois o pecado vai
produzir efeitos negativos na vida de quem o praticou, mas também vai afetar negativamente
as pessoas ao redor. A rebeldia de Jonas quase custou um preço muito alto para
as pessoas que estavam no navio, e que em nada haviam colaborado para que ele
agisse daquela forma.
Assim, antes de tomarmos decisões quanto a fazer ou deixar
de fazer algo, devemos pedir orientação de Deus para avaliar a repercussão que
isso poderá ter também na vida das pessoas que nos rodeiam, lembrando que devemos
ser canais de bênçãos.
2) É necessário despertar para a realidade (vv. 5-6)
Nota-se nos versículos 5 e 6 que, enquanto o navio era
castigado e todos a bordo se desesperavam, Jonas estava no porão dormindo
profundamente, alheio ao que acontecia.
O mestre do navio teve que acordá-lo e repreendê-lo para que
ele visse a situação que estava deixando todos aflitos e temerosos da vida. O
mundo estava desabando ao seu redor, mas Jonas parecia não ter notado o estrago
que sua atitude havia causado.
Por vezes nossas atitudes estão causando enorme dano a
outras pessoas, mas nós não estamos enxergando isso. É como se estivéssemos em
um sono profundo, alheios ao que acontece.
Trazendo para nossa vida no corpo de Cristo, que é a Igreja,
é comum ver irmãos agindo com negligência na obra do Senhor, deixando de usar
os dons recebidos para edificação do Corpo, acomodados em seus lugares como
meros ouvintes da Palavra, enquanto outros ficam sobrecarregados e a Igreja
caminha a duras penas, não conseguindo ter o desenvolvimento que deveria.
Nessa situação, aqueles que estão sobrecarregados, tendo que
fazer as funções que seriam daqueles que estão acomodados, podem acabar se
cansando, além do que, outros são desestimulados e aos poucos vai se observando
um esfriamento generalizado. E aqueles que estão sendo negligentes para com
seus dons permanecem como se estivessem em profundo sono, não enxergam o que
está acontecendo, não percebem o mal que estão causando. Às vezes até reparam
na falta de ânimo geral, mas não veem que tal situação foi proporcionada por
causa de sua conduta negligente.
Porém, isso não se restringe à vida na Igreja, pelo
contrário, abrange todas as esferas de nossa vida. A família é um dos ambientes
em que mais se veem consequências das atitudes das pessoas, bem como a falta de
percepção dessa realidade.
Pais que cultivam hábitos de vida que não são saudáveis verão
os filhos sofrendo com enfermidades com certa frequência, mas parecem estar em
um sono que não lhes permite enxergar que foram seus hábitos que levaram a tal
situação.
Cônjuges que não se respeitam e vivem discutindo parecem só
ver os resultados de suas atitudes quando o navio do relacionamento já
naufragou e a situação não tem volta. Pais que não disciplinam os filhos só
abrem os olhos quando os filhos já estão perdidos, sendo que durante toda a
vida viveram como se estivessem em um sono que não lhes permitisse enxergar o
mal que estavam causando por não ensinarem os filhos no caminho correto.
Irmãos, é necessário despertar antes que o navio se
despedace no mar bravio.
Na vida do cristão o Espírito Santo é o mestre do navio que
vem nos despertar. Por vezes Ele usa outras pessoas para nos fazer abrir os
olhos e enxergar o que está acontecendo antes que seja tarde.
Busquemos comunhão constante com o Espírito Santo, de
maneira que estejamos sensíveis para ouvirmos sua voz nos chamando a atenção
para as consequências de nossos atos.
3) É necessário assumir a responsabilidade (v. 12)
Depois de ser desperto de seu sono, Jonas foi apontado como
a causa de tudo aquilo, e foi interrogado para que dissesse o que havia feito
para que o seu Deus enviasse tamanho castigo.
Jonas sabia que Deus estava provocando aquela tempestade
porque ele havia sido desobediente e tentara enganar o Altíssimo, e ele
confessou isso perante os homens do navio, assumindo a responsabilidade pela
situação calamitosa.
Eis uma atitude muito difícil para o ser humano: assumir a
responsabilidade por seus atos.
Já no início da raça humana vemos essa dificuldade
manifestada em Adão. Quando Deus veio ao jardim do Éden após o casal ter
cometido o pecado da desobediência, Adão tentou fugir da responsabilidade
jogando a culpa na mulher e em Deus:
“Então, disse o homem: a mulher que me deste por esposa, ela
me deu da árvore, e eu comi.” (Gn 3.12)
Adão não quis assumir a responsabilidade pela sua decisão de
comer do fruto proibido, antes, afirmou que a mulher o havia convencido, e,
para se desonerar ainda mais, disse que aquela mulher que o levara a pecar lhe
fora dada por Deus, ou seja, o Criador, de certa forma, tinha culpa pelo
ocorrido, pois se não tivesse feito a mulher nada daquilo teria acontecido.
A grande maioria dos seres humanos segue o mesmo caminho de
Adão, de fuga da responsabilidade, todavia, esse padrão precisa ser mudado,
pois cada pessoa deve assumir a responsabilidade por suas decisões e escolhas.
Jonas teve a humildade de assumir a responsabilidade. Ele
disse aos homens do navio: “eu sei que, por minha causa, vos sobreveio
esta grande tempestade” (v. 12).
Reconhecer nosso erro, assumir a responsabilidade pelas
consequências de nossas escolhas e atitudes, é algo difícil, mas deve ser feito,
porque não podemos transferir a ninguém a culpa por nossas falhas.
E um dos grandes problemas que vemos hoje é justamente a
fuga da responsabilidade. Quase todos querem se fazer de vítimas das
circunstâncias e encontrar culpados, mas não conseguem olhar para si e fazer
uma autoanálise que leve à conclusão de que agiram para que a situação se
desenhasse da forma como está apresentada.
Assim, na Igreja vemos os cristãos empurrando a
responsabilidade pelo esfriamento sobre o pastor, os presbíteros, diáconos,
enfim, sobre a liderança, em vez de cada pessoa assumir sua cota de
responsabilidade pela situação em que está sua congregação. É mais fácil jogar
a culpa na liderança do que assumir a postura negligente, de alguém que não
participa dos trabalhos da congregação, que não dá ideias nem colabora para sua
implementação, de crentes que não evangelizam nem contribuem com os que cumprem
essa missão. É mais fácil criticar do que assumir sua parcela de
responsabilidade.
Mas também em outras áreas da vida isso acontece. O marido
considera mais fácil dizer que a esposa é fria, indiferente, descuidada, do que
assumir que ele não colabora com as tarefas do lar, não faz sua parte no
cuidado com os filhos, não age como um agregador, mas sim como um desestruturador
do lar, desobedecendo ao que a Bíblia ordena quanto ao casamento.
Igualmente, é mais fácil a esposa jogar no marido a culpa
pelo casamento que esfriou do que assumir que não se portou como uma fiel
auxiliadora e deixou de seguir os preceitos bíblicos no que diz respeito ao
relacionamento conjugal.
É mais conveniente ao empregado atribuir ao patrão a culpa
pela sua falta de êxito profissional, do que assumir que não se esforça, não
estuda, não faz nada para crescer. É mais fácil responsabilizar o governo pelas
nossas dificuldades do que reconhecer que não temos educação financeira,
planejamento, dedicação profissional, etc.
A Palavra de Deus nos mostra que precisamos assumir a
responsabilidade por nossas decisões, por nossas escolhas e também pelas
consequências que daí resultam.
Jonas disse que os homens deveriam lançá-lo ao mar para que
a tempestade parasse. Ele assumiu não apenas a responsabilidade, mas também as
consequências.
E nós, estamos prontos para agirmos como Jonas?
CONCLUSÃO
Tudo o que aconteceu no capítulo 1 foi consequência da
desobediência de Jonas a uma ordem de Deus. Por causa disso quase ocorreu a
morte de centenas de pessoas inocentes. Após acordar do sono e assumir a
responsabilidade por seus atos, dispondo-se a arcar com as consequências, Jonas
se arrependeu e buscou o perdão de Deus.
No final do capítulo 1, versículo 17, vemos que, após ser
lançado ao mar, Jonas foi engolido vivo por um grande peixe que Deus enviou,
ali permanecendo três dias e três noites. No capítulo 2 vamos o arrependimento
de Jonas, sua oração ao Altíssimo e sua libertação de dentro do grande peixe.
Já no capítulo 3, observamos os resultados da obediência de
Jonas. Uma vez que ele se arrependeu e foi perdoado pelo Altíssimo, ele partiu
para cumprir a ordem que antes havia negligenciado: pregar contra Nínive. E a
obediência de Jonas resultou em grande bênção para aquele povo, pois houve
arrependimento e Deus não destruiu a cidade.
Quando contemplamos as grandes tormentas que acontecem em
nossas vidas e o estrago que nossas atitudes causam na vida das pessoas,
devemos buscar em Deus o perdão por nossa desobediência, por nossa arrogância,
pelos pecados que causaram tais situações, e, assim, retomar a caminhada em
santidade e obediência ao Altíssimo.
Um fato que é demonstrado e reiterado várias vezes na Bíblia
é que a obediência dos servos de Deus resulta em bênçãos não apenas para eles,
mas também para as pessoas com quem mantém algum tipo de relacionamento.
Desta forma, se caminhamos em paz com Deus e em obediência, isso
resultará em bênçãos na família, na igreja, no trabalho, na vida social, e seremos
canal de bênção ao nosso próximo.
Que Deus nos dê a capacidade de sermos obedientes à sua
Palavra e de assumirmos a responsabilidade por nossas decisões, dispondo-nos
sempre a buscar no Altíssimo o perdão e a força para continuar a caminhar em
santidade.
“De ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te
engrandecerei o nome. Sê tu uma bênção!” (Gênesis 12.2)
“22 Porém Samuel disse: Tem, porventura, o SENHOR tanto
prazer em holocaustos e sacrifícios quanto em que se obedeça à sua palavra? Eis
que o obedecer é melhor do que o sacrificar, e o atender, melhor do que a
gordura de carneiros.”
(1Sm 15.22)
José Vicente
12.11.2017Leia também:
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