quarta-feira, 24 de março de 2021

APRENDENDO COM A NEGAÇÃO DE PEDRO

 


Texto base: Marcos 14.27-31, 50 e 66-72

O Evangelista Marcos faz uma narrativa dos fatos que ocorreram nas 48 (quarenta e oito) horas que antecederam a morte de Jesus, sendo que no capítulo 14 encontramos (i) a unção feita por uma mulher em Betânia, (ii) a traição de Judas, e (iii) a negação de Pedro e demais discípulos. No capítulo 15 encontramos a narrativa do julgamento.

Sabemos que Pedro era um dos discípulos mais envolvidos com o ministério de Jesus, alguém que tinha maior proximidade com o Mestre, junto com João e Tiago, portanto era de se esperar que ele se mantivesse firme ao lado de Jesus durante aquele momento extremamente difícil, mas a realidade foi outra.

Quando pressionado, Pedro disse que não conhecia a Jesus, que não era seu discípulo e até chegou a ofender as pessoas que o indagavam.

Os outros discípulos simplesmente fugiram a abandonaram Jesus quando este foi preso e levado ao sumo sacerdote.

É natural que a narrativa apresentada provoque em nós sentimentos de reprovação à conduta de Pedro e dos demais discípulos. Afinal, entendemos que eles eram amigos de Jesus, contavam com Sua confiança, e no momento mais doloroso da vida do Mestre simplesmente desapareceram, abandonando Jesus nas mãos dos algozes.

O problema é que talvez não estejamos em condições de julgar e condenar aqueles homens por sua conduta, porque em seu lugar não sabemos se teríamos agido de outra forma.

O importante é que, ao lermos o relato do Evangelista Marcos, percebamos as lições que a Bíblia quer nos ensinar, pois, conforme escreveu Paulo na Segunda Carta a Timóteo: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça” (2 Timóteo 3:16).

O que podemos aprender com o relato feito pelo Evangelista Marcos?

 

     1)    Aprendemos que somos mais fracos do que pensamos

Quando Jesus disse a seus discípulos que eles o abandonariam, Pedro rapidamente disse que ele jamais se escandalizaria com o Mestre, e após Jesus lhe dizer que ele O negaria por três vezes, Pedro afirmou que de maneira nenhuma negaria a Jesus, e que se fosse necessário daria sua vida pelo Senhor. E os demais discípulos confirmaram que tinham essa mesma disposição (v. 27-31).

Todavia, assim que Jesus foi preso, Marcos narra que “deixando-o, todos fugiram” (v. 50). E depois, quando Jesus foi levado ao Sumo Sacerdote, Pedro foi reconhecido por algumas pessoas como discípulo de Jesus, mas veementemente o negou.

Causa perplexidade ver um homem que, poucos instantes antes, havia jurado fidelidade a Jesus, subitamente, ao ser pressionado, não titubeou em negar que tivesse algum vínculo com Jesus ou que ao menos o conhecesse. E os demais discípulos, que juntamente com Pedro haviam afirmado que se fosse preciso morreriam por Jesus, também sumiram diante do perigo.

Antes de condenarmos Pedro e os demais discípulos por sua atitude, precisamos refletir quanto à lição que essa passagem nos ensina com relação a nós mesmos. A narrativa de Marcos não foi incluída na Bíblia com o intuito de envergonhar aqueles homens, mas para servir de alerta para todos nós, discípulos de Jesus, que juramos fidelidade ao Mestre e acreditamos ser capazes de dar nossa vida por Jesus.

Essa passagem vem nos ensinar que somos mais fracos do que pensamos!

Quando Pedro e os demais discípulos afirmaram que se manteriam fieis a Jesus e que seriam capazes de morrer pelo Mestre, eles estavam sendo sinceros, pois acreditavam realmente que teriam capacidade para assim proceder. Todavia, Jesus os conhecia profundamente, e sabia muito mais de suas fraquezas do que eles próprios. Jesus os advertiu do que iria acontecer, mas eles não aceitaram, pois estavam convictos de que teriam condições de cumprir o que diziam.

Diante, porém, de uma circunstância que trazia perigo e causava temor, eles se viram fragilizados e não tiveram coragem de acompanhar o Mestre, fugindo apressadamente e negando a Jesus.

Jesus não ficou surpreso, pois os conhecia bem demais, porém eles devem ter se sentido extremamente confusos diante de tal situação, pois mostraram covardia justo quando deveriam ter sido corajosos. Abandonaram um companheiro justo no momento em que Ele precisaria do apoio de seus amigos.

Ali, eles entenderam que não eram tão fortes como pensavam. Que toda aquela confiança que tinham em si mesmos era vazia e enganosa, porque no fundo eram fracos e medrosos, fariam qualquer coisa para salvar suas próprias vidas.

A exemplo de Pedro e seus companheiros, podemos cometer o erro de confiar demasiadamente em nossa capacidade, em nossa força, considerando-nos mais fortes do que realmente somos e ignorando nossas fraquezas.

Não podemos condenar Pedro e os demais justamente porque somos como eles. Temos a mesma natureza, a mesma tendência de achar que somos autossuficientes e que agiríamos diferente deles naquela situação, mas a verdade é que faríamos a mesma coisa.

Com a narrativa registrada em Marcos, Deus nos confronta para que olhemos para nós mesmos e reconheçamos o quão fracos somos, fugindo do autoengano. Ainda que sejamos sinceros em nossas declarações de amor e fidelidade a Deus, jamais podemos ignorar nossas fraquezas.

Quando mergulhamos no autoengano, crendo que somos muito fortes e fieis, tendemos a desenvolver algo que desagrada sobremaneira a Deus: o orgulho, a soberba.

Reconhecer nossas fraquezas é alimentar a humildade. Acreditar que somos fortes e inabaláveis pode conduzir à arrogância e à queda.

“A soberba precede a ruína, e a altivez do espírito, a queda.” (Provérbios 16:18)

Deus quer que nos mantenhamos humildes e dependentes dEle. Para isto, é essencial reconhecermos que não somos fortes como gostaríamos, mas que temos muitas fraquezas, pois assim receberemos o sustento do próprio Deus, que nos fortalecerá para vencermos os desafios da caminhada cristã.

Paulo assim escreveu: “Porque, quando sou fraco, então, é que sou forte.” (2 Coríntios 12:10)

Quando reconhecemos nossa fraqueza, acabamos nos esvaziando do sentimento de autossuficiência, assumimos nossa dependência de Deus e nos abrimos à ação do Espírito Santo em nós, de maneira que o Poder de Deus se manifestará em nossa fraqueza, assim como acontecia com Paulo.

Se, porém, cultivarmos a crença de que somos naturalmente fortes, ignorando nossas fragilidades, certamente o poder de Deus não se manifestará plenamente em nós e por meio de nós, e será necessário que sejamos submetidos a um tratamento da parte do Altíssimo para que nossa autossuficiência seja extirpada e, enfim, possamos ser usados como instrumentos da glória de Deus.

 

     2)    Aprendemos que é possível negar a Cristo não apenas com palavras, mas também com atitudes

Naquele fatídica noite, Pedro pronunciou palavras de negação. Claramente afirmou que não era discípulo de Cristo e que não o conhecia. Brigou com as pessoas que diziam que ele era um dos seguidores de Jesus.

Os demais discípulos, porém, não negaram Jesus com palavras, mas com sua atitude. O versículo 50 informa que todos o abandonaram assim que Ele foi preso. Eles podem não ter sido arguidos por outras pessoas como foi Pedro, mas negaram a Cristo quando agiram de forma oposta ao que haviam afirmado ao Mestre, abandonando-o e fugindo para não sofrerem consequências por serem seus discípulos.

É possível que nossas palavras sejam de amor e fidelidade a Jesus. Talvez nosso falar seja agradável e coerente com as Escrituras. Pode ser que nossas orações sejam feitas com fervor e fé. Mas a despeito de tudo isso, existe a possibilidade de que nossas atitudes se constituam em verdadeira negação de nossa fé e, consequentemente, de Cristo.

Quando Jesus estava ensinando aos seus seguidores, disse-lhes que deveriam imitar os escribas e fariseus em seus ensinamentos, mas não em suas práticas diárias:

“Fazei e guardai, pois, tudo quanto eles vos disserem, porém não os imiteis nas suas obras; porque dizem e não fazem.” (Mateus 23:3)

De acordo com Jesus, os atos praticados por aqueles líderes religiosos eram egoístas, tinham a finalidade de se mostrar diante das pessoas e eram incompatíveis com o que ensinavam ao povo.

Por esta razão, precisamos estar sempre vigilantes, cuidando para que não venhamos a negar a Jesus com nossas atitudes, embora nossos lábios pronunciem palavras de louvor e adoração.

As pessoas ao nosso redor estão mais atentas ao que fazemos do que às nossas palavras. O nosso testemunho de vida fala mais alto do que as nossas declarações, porque se não houver coerência entre a fé professada e as atitudes do dia a dia, de certa forma estaremos negando que conhecemos a Cristo e que somos seus discípulos, embora tentemos dizer o contrário com nossos lábios.

Jesus disse: “Se me amais, guardareis os meus mandamentos.” (João 14.15)

O maior sinal de que amamos verdadeiramente a Jesus é guardar os seus mandamentos, ou seja, obedecer à Sua Palavra. A falta de coerência entre nossas declarações de fé e nossos atos é uma forma de negar a Cristo, porque estamos desobedecendo aos Seus mandamentos e agindo como se não o conhecêssemos.

 

     3)    Aprendemos que o arrependimento traz perdão e transformação

No versículo 72 o evangelista Marcos diz que após a terceira negação, tendo cantado o galo, Pedro se lembrou do que Jesus havia lhe falado e começou a chorar. Mateus e Lucas dizem que ele chorou amargamente (Mateus 26.75 e Lucas 22.62).

O choro de Pedro traduz o seu arrependimento, a dor que ele sentia por ter negado ao seu Mestre, a quem ele amava e por quem afirmara que daria sua vida. Ele havia caminhado por três anos ao lado de Jesus, aprendendo com Ele, compartilhando suas experiências. Havia visto maravilhas sendo feitas por Jesus e recebera, ele próprio, poder para operar sinais e anunciar o Evangelho. E, de repente, em um momento onde a vida de seu Mestre estava para ser ceifada, ele não conseguiu manter sua fidelidade e simplesmente negou ter qualquer envolvimento com Jesus.

Provavelmente a dor que Pedro sentiu foi muito grande quando percebeu que havia acabado de fazer aquilo que Jesus dissera que ele faria, embora ele tivesse afirmado que daria sua vida por Cristo. Quando é dito que ele chorou amargamente significa que a sua dor era enorme.

Entretanto, não se trata apenas de chorar pelo pecado cometido. A continuidade da história narrada nos Evangelhos e demais livros do Novo Testamento revela que tanto Pedro como os demais discípulos foram perdoados e transformados após a ressurreição de Jesus.

Aqueles homens nunca mais negaram a Cristo e à sua fé. Pelo contrário, eles foram perseguidos por serem servos de Jesus, e mesmo sendo presos, torturados e ameaçados continuaram a proclamar o Evangelho, anunciando que Jesus é o Caminho, a Verdade e a Vida.

Eles acabaram cumprindo o que haviam dito a Jesus, pois foram capazes de dar suas vidas pelo Mestre. Morreram por crerem em Jesus e por anunciarem-no como o Messias que era esperado, o Salvador em que está a vida eterna.

Sabemos que eles se arrependeram pelo pecado da negação pelo fato de nunca mais terem voltado a cometer o mesmo erro. Eles foram transformados e fortalecidos pelo perdão de Cristo e pelo Espírito Santo agindo em suas vidas.

Ao longo de nossas vidas podemos experimentar esse tipo de dor algumas vezes, quando magoamos pessoas a quem amamos, quando causamos dor a alguém, quando nossas atitudes ferem e provocam estremecimento de relacionamentos.

Assim também podemos sentir a dor que é causada pela prática do pecado, pela adoção de um estilo de vida que contraria a fé que professamos, mas é necessário que essa dor provoque arrependimento, ou seja, mudança de vida.

Da mesma forma que Pedro e os demais discípulos foram perdoados por seu pecado de negação, também nós podemos ser perdoados quando cometemos esse ou outros pecados e nos arrependemos verdadeiramente, abandonando a prática pecaminosa e buscando obedecer à Palavra de Deus.

Cabe ressaltar que não adianta chorar mas continuar a insistir na mesma prática pecaminosa. Isso não é arrependimento e não atrai o perdão de Deus. Pedro chorou amargamente, e após a ressurreição Jesus veio até ele, deixou evidente que o havia perdoado e o comissionou a ser Sua testemunha, da mesma forma que aconteceu com os demais discípulos que haviam fugido na noite em que Jesus foi preso.

O perdão de Jesus está disponível a quem se arrepende de seus pecados. Ele morreu na cruz justamente para que o perdão fosse derramado sobre nós e para que não passássemos a vida toda carregando o peso dos erros cometidos e do sentimento de culpa que isso gera.

Jesus restaurou Pedro, livrou-o de sua culpa e o transformou em um dos pilares da Igreja em seus primórdios. Jesus também restaurou os demais discípulos, de forma que o perdão os libertou da culpa e o Espírito Santo os capacitou a serem missionários que proclamaram o Evangelho em todo o mundo e deram suas vidas em prol do Senhor Jesus.

O mesmo perdão está disponível para nós, que erramos, pecamos e por vezes negamos a Cristo com nossas atitudes ou palavras. Jesus nos chama ao arrependimento para que sejamos libertados da culpa e possamos ser transformados pela ação do Espírito Santo, de maneira a sermos testemunhas fieis de Cristo neste mundo, onde é tão difícil viver de modo digno do Evangelho.

 

CONCLUSÃO

Nós não somos perfeitos e estamos sujeitos a errar, ainda que sejamos sinceros em nossas declarações de fé e amor a Jesus. Nossos erros, porém, não devem nos desestimular na caminhada cristã, não podem nos levar ao desânimo, porque Jesus nos estende Sua mão e concede Seu perdão quando nos arrependemos e nos dispomos a ser transformados.

Pedro fraquejou porque confiou em sua própria força, mas a partir do momento em que ele passou a viver firmado unicamente pela força que vem de Deus, ele se tornou um homem valoroso, um instrumento por meio do qual Jesus foi apresentado a milhares ou milhões de pessoas que também tiveram suas vidas transformadas.

Pedro e os demais discípulos superaram a tristeza do pecado da negação porque Jesus os perdoou. Eles puderam caminhar sem as redes de culpa que os enredavam. E pode ser que nossa caminhada esteja sendo muito lenta porque estamos arrastando redes de culpa.

Entreguemos a Jesus nossos medos, nossas fraquezas, nossos pecados. Busquemos o perdão que Ele nos dá e sujeitemo-nos à atuação do Espírito Santo para que nosso ser seja transformado e nós, a exemplo de Pedro e seus companheiros, consigamos ser instrumentos do Poder de Deus para salvação das pessoas que nos conhecem.

“a fim de viverdes de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado, frutificando em toda boa obra e crescendo no pleno conhecimento de Deus; sendo fortalecidos com todo o poder, segundo a força da sua glória, em toda a perseverança e longanimidade; com alegria, dando graças ao Pai, que vos fez idôneos à parte que vos cabe da herança dos santos na luz.” (Colossenses 1:10-12)

Que Deus nos fortaleça a cada dia. 

José Vicente.