O texto lido narra uma história bastante triste, pois apresenta uma sequência de acontecimentos que culminaram com tragédias na família do Rei Davi.
Nos versículos encontramos a narrativa de uma verdadeira aberração, quando Amnon, filho de Davi, sente-se extremamente atraído por sua própria irmã, Tamar, sendo ambos filhos do rei, mas de mulheres diferentes.
Amnon, auxiliado por um “amigo” (se fosse amigo mesmo não faria o que fez), fingiu-se de doente para poder receber cuidados de Tamar, e aproveitou-se da situação para estuprá-la, sendo que, logo após o ato incestuoso e criminoso, simplesmente a repudiou, mandando-a embora constrangida, envergonhada, humilhada.
Após essa tragédia, outras se abateram sobre a família de Davi, como o homicídio de um irmão por outro, a rebelião de Absalão e sua morte em batalha.
Vamos analisar alguns pontos que podem ter provocado essa situação caótica, e que hoje ainda estão presentes em muitas famílias, sendo a causa de sua ruína.
1. Omissão dos pais quanto à disciplina
A notícia do estupro de Tamar por seu irmão Amnon chegou ao conhecimento de Davi, o chefe da família, e este ficou extremamente irado. Entretanto, sua reação parou por aí, já que Davi não tomou nenhuma providência quanto ao ocorrido. Davi não falou com Amnon, não o repreendeu, não o puniu, simplesmente ficou quieto como se nada tivesse acontecido (13.21). A versão da Bíblia católica traz esse texto da seguinte forma:
“O rei Davi soube de tudo o que se tinha passado, e inflamou-se com violência a sua cólera, mas não quis afligir seu filho Amnon, pois o amava por ser o seu primogênito.”
Bem se vê, portanto, que Davi se omitiu quanto ao seu dever de disciplina, de correção, e com isso pensou estar demonstrando amor ao seu filho Amnon, pois a punição para o ato praticado por ele era bastante severa (Lv. 18. 6, 9, 11 e 29; Lv. 20.17; Dt. 27.22).
Como resultado da omissão de Davi, Absalão ficou extremamente revoltado e sentiu que deveria fazer justiça com suas próprias mãos, como forma de suprir a frouxidão de seu pai, e passou dois anos guardando o ódio em seu coração e esperando o momento certo para aplicar a devida punição ao transgressor.
Amnon foi morto diante de todos os demais irmãos, que fugiram apavorados (13.28-29). Davi novamente se omitiu, pois Absalão fugiu e seu pai não procurou trazê-lo de volta para que fosse julgado pelo crime cometido, tendo ficado impune.
Naquele tempo, o homem era o chefe da família, o grande responsável pela disciplina, e a mulher lhe era submissa. Hoje, porém, marido e esposa dividem igualmente a responsabilidade pela educação dos filhos, ambos têm autoridade para disciplinar e ensinar o caminho correto.
Assim como aconteceu com Davi, muitos pais atualmente têm se omitido em seu dever de disciplina para com os filhos. Está ocorrendo uma inversão de valores, onde os filhos parecem ter mais autoridade dentro dos lares do que os pais, sendo que estes já não conseguem impor respeito em casa.
Pais que veem os filhos no erro e não procuram a correção estão sendo negligentes. O silêncio diante de erros pode ser fatal para o futuro de toda a família. Alguns pais julgam que os filhos devem ser corrigidos apenas quando estiverem maiores, pois no seu entendimento “crianças não compreendem e são inocentes”. Sim, são inocentes, mas seu cérebro está assimilando tudo desde antes do nascimento. Se não há disciplina, a mente da criança gera a ilusão de que não há limites, de que ela pode fazer tudo o que quiser, o mundo é seu, as pessoas existem para servi-la.
Filhos que crescem sem disciplina sofrem muito, pois o mundo lhes mostrará que a ausência de limites que eles pensavam haver era pura ilusão, e então seu pequeno mundinho desmoronará, eles ficarão atordoados, perdidos, se julgarão enganados, se tornarão vingativos, podem buscar conforto no álcool e nas drogas, nas amizades maléficas, enfim, muitas coisas ruins podem acontecer, e tudo por causa da omissão dos pais quando era o tempo da correção.
É claro que deve haver sabedoria por parte dos pais, caso contrário o que deveria ser para correção se transforma em motivo de revolta e pode criar situações tão terríveis quanto aquelas motivadas pela falta de disciplina. Alguns pais levam ao pé da letra o que está em Provérbios 23.13-14, onde é dito para não afastar a vara da criança, e acham que é possível educar os filhos batendo neles todas as vezes em que fazem algo errado.
O que a Bíblia pretende ensinar é simplesmente que os pais não devem jamais deixar de corrigir seus filhos, a fim de que não venham mais tarde a sofrer consequências terríveis. Vara, na Bíblia, sempre está associada a correção, disciplina, mas não significa necessariamente a punição física, pode também ser empregada a perda de regalias, a supressão de algo do qual o filho goste muito (atualmente, computador e internet, vídeo game, etc.), conversas francas com explicações sobre o que foi feito pela criança e porque ela não deve mais fazer isso, etc.
A falta de disciplina em casa tem produzido inúmeros adolescentes, jovens e adultos rebeldes, desorientados, perdidos, mal-amados e desprovidos de amor para com o próximo.
Há, ainda, a omissão quanto à presença, ao amor, ao acompanhamento de todas as fases da vida. Pais ausentes podem produzir filhos muito problemáticos, inseguros, sem referencial, etc.
Há, ainda, a omissão quanto à presença, ao amor, ao acompanhamento de todas as fases da vida. Pais ausentes podem produzir filhos muito problemáticos, inseguros, sem referencial, etc.
2. A perda da autoridade dos pais
Davi era o chefe de sua família, e também o líder de sua nação. Ele era respeitado pelo seu povo e temido pelos inimigos. Deus era com ele e o que ele fazia prosperava. Entretanto, sua omissão no momento em que deveria ter tomado uma atitude quanto ao filho Amnon fez com que sua autoridade sofresse um abalo muito grande.
Absalão, que também era filho de Davi, vendo que seu pai não fizera absolutamente nada sobre o caso do estupro de Tamar, chamou para si a responsabilidade de punir o infrator (13.32).
Após o assassinato de Amnon, Absalão fugiu para Gessur, onde permaneceu por três anos (13.37). Davi novamente se omitiu, pois não tomou providências a fim de que Absalão pagasse por seu crime.
Joabe engendrou um plano para que Davi repatriasse Absalão, e para isso contou com uma mulher que se dispôs a enganar o rei com uma história inverídica. Davi, mesmo após saber que a narrativa não era real, entendeu que deveria perdoar Absalão e permitir seu retorno, o que acabou acontecendo (14. 13-21).
Absalão, depois de ter retornado, tramou um plano para tomar o trono, conquistando a simpatia do povo e levá-lo a acreditar que Davi não era um bom rei e que não merecia o trono (15.1-6). O povo se bandeou para o lado de Absalão, de forma a apoiá-lo quando ele resolveu dar o golpe para assumir o trono de Israel.
Com tudo armado, Absalão entendeu que era hora de agir e reuniu seus aliados, que não eram poucos, para finalmente destronar seu pai e ser o novo soberano sobre Israel (15.10-14).
Ainda, Absalão passou a abusar das concubinas de seu pai, mostrando que Davi não era digno de ocupar aquele lugar (16.22).
Ora, está mais do que claro que Davi perdeu sua autoridade, não apenas no seio familiar, mas também junto ao seu povo, como líder. Os israelitas, que conheciam a história passada na família de Davi, aderiram a Absalão (15.13). Ninguém mais via Davi como alguém digno de comandar o reino, afinal, como poderia dirigir uma nação alguém que não tinha competência para comandar sua própria família?
Da mesma forma, isso continua acontecendo hoje no seio das famílias. A omissão dos pais quanto à correção dos filhos faz com que sua autoridade vá se deteriorando pouco a pouco, de maneira que, quando resolverem se contrapor a algo que os filhos estejam fazendo, não serão ouvidos, e, pior, serão confrontados com respostas e atitudes duras, agressivas.
Ambos os pais têm que adotar a mesma postura, precisam estar unidos, a fim de que aquilo que um fala seja ratificado pelo outro. Caso contrário, quando a mãe repreender o filho, este responderá que ela está sendo radical, ruim, quadrada, porque o pai deixou passar, o pai falou algo diferente, etc. Um vai minando a autoridade do outro.
Não deixe sua autoridade sobre seus filhos ser destruída por causa da sua omissão nos momentos em que há necessidade de corrigir os erros. Se isso acontecer, quem educará seus filhos? A quem eles vão ouvir? Quem será a referência deles? O pai frouxo? A mãe submissa e “bobona”?
Pais que perdem a autoridade no lar deixam de ser dignos de servir como exemplos para os filhos, suas palavras não tem valor, e há necessidade de que alguém assuma o comando da casa, ou seja, os próprios filhos, que passam a se sentir mais fortes e firmes do que os pais. Há uma verdadeira inversão de valores.
Será que isso já não está acontecendo em sua casa?
3. Perdas irreparáveis
Davi foi omisso uma vez e perdeu um filho, Amnon. Além disso, a filha, Tamar, foi desonrada, envergonhada e, com certeza, passou a considerar-se morta para seu pai. Quando foi omisso pela segunda vez, Davi perdeu mais um filho, Absalão, morto na batalha pelo reino de Israel (18. 14-17).
Davi só não perdeu a vida e o reino de Israel porque Deus era com ele e havia mantido alguns homens fiéis para auxiliá-lo, caso contrário, o desastre teria sido muito pior.
Eis uma história trágica, que poderia ter chegado a outro final se Davi não tivesse sido omisso em momentos cruciais. Ele falhou na direção de sua família.
Hoje, vemos muitos jovens perdidos nas drogas, nas bebidas, na prostituição, na vida de crimes. É claro que muitos deles tiveram pais dedicados, que tentaram ensinar o melhor aos filhos mas estes acabaram encontrando outro caminho que consideraram que fosse melhor, e fecharam os ouvidos às vozes dos pais.
Não se pode negar, porém, que uma enorme parte desses jovens vem de famílias onde os erros não eram corrigidos, onde parecia não existirem limites para nada, sendo tudo permitido. Muitos deles vêm de famílias onde os chefes da casa (pai e mãe) se tornaram submissos aos próprios filhos, pois não exerceram sua autoridade e se omitiram em seu dever de disciplinar e ensinar o que é certo.
Pais e mães choram ao ver os filhos perdidos, morrendo, e se arrependem por não terem sido mais firmes quando deveriam.
As consequências de um lar onde não há autoridade paterna e materna são terríveis. As perdas são muito dolorosas. O esfacelamento das famílias é uma realidade dura e inquestionável.
Conclusão
Davi nos mostrou, com sua vida, como NÃO se deve agir em relação à família. É claro que se ele tivesse refletido melhor, se tivesse conseguido visualizar quais seriam as consequências de sua forma de proceder, muito provavelmente teria agido de outra forma.
Sabemos que Davi era um homem segundo o coração de Deus, mas isso não o isentava de erros e também das suas consequências.
Se atentarmos para o capítulo anterior de 2 Samuel (12), encontraremos a narrativa de dois terríveis pecados de Davi: adultério com Bate Seba e morte do marido desta.
Ora, foi aí que Davi começou a perder sua credibilidade no seio familiar. Talvez na sua própria mente ele mesmo pensasse: “como vou repreender meus filhos, se eu mesmo fiz coisas tão terríveis?”. Talvez ele não sentisse força moral para disciplinar ninguém.
Assim, vemos que o exemplo é de suma importância. Os pais precisam, para poderem ter alguma autoridade no lar, ser os primeiros a dar o exemplo aos filhos. Não adianta dizer ao filho que ele não deve fumar, se o pai não tira o cigarro da boca. Não adianta dizer que o filho não deve mentir, se a mãe vive inventando mentiras.
Assim também nós não estamos livres de cometermos erros, todavia, precisamos saber que temos responsabilidades para com nossas famílias. Os pais devem ter consciência de que é sua obrigação educar os filhos com amor, e isso não significa deixar de repreender e passar a mão na cabeça quando fizerem coisas erradas, pois a disciplina é um sinal de amor. Pais que amam corrigem hoje para que os filhos não sofram muito mais amanhã.
É assim que Deus faz conosco: Ele nos corrige quando pecamos, quando enveredamos por caminhos errados, exatamente porque Ele nos ama e quer o nosso bem, e não a nossa destruição, e Ele deu aos pais a responsabilidade pela correção dos filhos, para que cresçam e sejam pessoas corretas, equilibradas, dotadas de princípios morais elevados (Hebreus 12.5-11).
Oremos a Deus para que nos dê sabedoria e discernimento, com vistas a sermos bênção em nossas famílias, agindo sempre conforme a orientação que Deus nos deu através das Escrituras. Mais vale o sentimento de termos feito o nosso melhor, do que o choro de arrependimento por termos sido omissos.
José Vicente
legal demais sua postagem
ResponderExcluir