Mateus 20.29-34
O
texto que lemos apresenta a história de dois cegos que receberam de Jesus o
milagre da cura, após insistirem em clamar por Ele apesar da grande multidão
que o cercava.
Trata-se
de uma passagem bem conhecida da Bíblia, e que se encontra narrada também no
Evangelho escrito por Marcos, no capítulo 10:46-52, e em Lucas 18.35-43, mas
ali os evangelistas se concentraram apenas em um dos cegos, de nome Bartimeu,
talvez por ser o que mais tivesse se destacado no episódio.
Trata-se
de uma passagem rica em ensinamentos, que mostra mais um momento em que Jesus,
após ministrar um ensino aos seus ouvintes, passou à prática do que havia
ensinado, de maneira que as pessoas pudessem ter uma melhor compreensão e
percebessem que a fé deve vir acompanhada de atos que a confirmem.
No
texto podemos encontrar três personagens que, por meio de sua atuação, nos
transmitem ensinamentos que devem nos acompanhar em nosso dia a dia como
cristãos.
1) A MULTIDÃO
O
texto registra que uma multidão acompanhava Jesus quando ele saiu de Jericó. Os
Evangelhos sempre relatam que Jesus era seguido por multidões quando se
deslocava pelas cidades, pelas aldeias, pelos campos, havendo poucos momentos
em que ele não se via cercado de centenas ou até milhares de pessoas.
Essa
multidão ouvia os ensinos de Jesus, experimentava o seu poder ao receber curas,
libertações, e até mesmo alimento, como no caso da multiplicação de pães e
peixes. E como sempre, a multidão era formada por diversos tipos de pessoas.
Havia os que estavam interessados sinceramente em ouvir os ensinos de Jesus
sobre o Reino de Deus. Mas também havia os que apenas buscavam o beneficio
imediato que poderiam obter pela intervenção sobrenatural de Jesus.
Certamente
nessa multidão havia muitos que, embora estivessem seguindo Jesus e
testemunhando seus grandes feitos, não assimilavam seus ensinamentos, pois suas
mentes estavam engessadas pela religiosidade dos ritos judaicos, pelos pensamentos
moldados à cultura da sociedade em que viviam, ou por qualquer outro motivo.
E
isto fica claro quando o texto nos diz que a multidão repreendia os cegos que
clamavam a Jesus, ordenando que ficassem calados (v. 31).
Por
que a multidão se incomodou com os cegos chamando por Jesus? Por que a multidão
os repreendia para que se calassem? Por que as pessoas daquela multidão não se
dispuseram a conduzir os cegos até Jesus? Onde estava a compaixão daquelas
pessoas?
Talvez
simplesmente porque aquelas pessoas não tivessem realmente compreendido e
assimilado ainda o que Jesus vinha ensinando. Eles seguiam Jesus, ouviam seus
ensinos, mas isso não penetrava em seus corações e não mudava suas mentes.
Pouco
antes, no versículo 28, Jesus disse que não tinha vindo para ser servido, mas
para servir e dar sua vida em resgate por muitos. E ele assim falou porque a
mãe de João e Tiago havia pedido a Jesus que seus dois filhos se sentassem ao
lado dele no seu Reino, um à sua direita e outro, à esquerda, gerando discussão
entre os discípulos.
Então
Jesus afirmou que quem quisesse ser o primeiro deveria ser servo dos outros, e
complementou explicando que ele próprio viera para servir, e não para ser
servido.
Se
a multidão tivesse entendido a mensagem, certamente não teria repreendido os
cegos, pelo contrário, as pessoas iriam se dispor a conduzi-los até Jesus,
cumprindo o papel de servir ao próximo. Mas a reação das pessoas foi de mandar
os cegos se calarem, bem ao contrário do que Jesus vinha ensinando.
A
conduta daquele povo que ali estava passa a impressão de que as pessoas estavam
agindo de forma egoísta, querendo Jesus apenas para elas e se considerando
aptas a escolher quem poderia se aproximar de Jesus.
Talvez
eles achassem que Jesus, por ser um mestre sábio e poderoso em obras, não
deveria perder tempo com dois cegos que o importunavam. Talvez suas mentes
estivessem muito cheias de religiosidade, mas suas vidas se mostravam vazias da
prática do amor de Deus.
A
multidão representa todos nós que seguimos a Jesus, que vemos a realização de
obras transformadoras, mas não nos dispomos a servir como pontes para que outras
pessoas cheguem até o Mestre.
Nós,
que conhecemos a Jesus e aos seus ensinamentos, não raras vezes nos
assemelhamos àquela multidão, querendo usufruir das bênçãos de Jesus de forma
egoísta, sem compartilhar com nosso próximo o conhecimento sobre Cristo, a
prática do amor e da compaixão, e em vez de conduzir pessoas a Cristo, acabamos
por afastá-las.
Quantas
vezes cedemos à tentação de escolher com quem vamos compartilhar o testemunho
sobre a Graça de Jesus que se manifestou em nossas vidas, deixando de lado
aqueles que, de certa forma, não consideramos que mereçam ouvir o Evangelho e
ter um encontro com Cristo?
Quantas
pessoas que necessitam ter um encontro com Jesus permanecem na ignorância
porque não queremos compartilhar o “nosso” Jesus com elas! Porque não estamos
dispostos a pegarmos em suas mãos e conduzi-las ao Mestre!
Precisamos
ter cuidado para não agirmos como aquela multidão, que em vez de demonstrar
amor e compaixão pelos necessitados, mandava que se calassem e lhes negava a
oportunidade de terem suas vidas transformadas pelo encontro com Cristo.
Fomos
chamados para servir, imitando nosso Senhor Jesus, de forma que por nosso
intermédio muitos possam conhecer o Mestre como nós O conhecemos.
2)
OS CEGOS
Outros
dois personagens que vemos no texto são os dois cegos que estavam à beira do
caminho (v. 30). Esses homens estavam ali mendigando, pois naquele tempo a sua
deficiência não lhes permitia o exercício de algum ofício, e não havia
benefícios da previdência social ou Sistema Único de Saúde para auxiliá-los, de
maneira que a opção que lhes restava era contar com a compaixão das pessoas por
meio de esmolas.
Eles
estavam sentados à beira do caminho, pois era um lugar onde certamente
passariam muitas pessoas ao longo do dia, o que aumentava suas chances de
receberem alguma coisa dos transeuntes.
Mas
o texto revela uma coisa muito importante sobre os dois cegos: eles eram
judeus, não eram gentios! Ou seja, eles eram parte do povo de Deus, estavam
inseridos na aliança que Deus fez com Israel.
Compreendemos
isso quando observamos a forma como chamaram por Jesus, que revela que tinham
conhecimento quanto às profecias a respeito do Messias, pois utilizaram um
título messiânico: “Senhor, Filho de
Davi”.
A
expressão Filho de Davi é uma referência à promessa dada por Deus por
intermédio dos profetas, de que o Redentor de Israel, o Messias, seria da
descendência do rei Davi, conforme vemos em Jeremias:
“Eis
que vêm dias, diz o Senhor, em que levantarei a Davi um Renovo justo; e, rei
que é, reinará, e agirá sabiamente, e executará o juízo e a justiça na terra.” (Jeremias 23:5)
Portanto,
os cegos eram conhecedores das profecias. Eles conheciam a Lei de Deus e as
profecias que davam esperança aos israelitas.
Além
disto, o texto permite concluir que aqueles homens já tinham ouvido falar de
Jesus. Provavelmente já haviam chegado aos seus ouvidos os relatos sobre as
curas, as libertações, os ensinamentos de Jesus. E isso os levou a crerem que
Jesus era o Messias.
Movidos
por essa convicção, eles clamavam a Jesus porque acreditavam que Ele tinha
poder para curá-los da cegueira. Sem ter conhecido Jesus pessoalmente, mas
apenas pelo testemunho que havia chegado aos seus ouvidos, eles manifestaram o
desejo de ter um encontro com Jesus, na plena confiança de que isso
transformaria suas vidas para sempre. Eles não se contentaram em conhecer Jesus
pelas experiências dos outros, mas queriam eles próprios ter a sua experiência
pessoal com o Mestre.
Entretanto,
eles esbarraram na falta de boa vontade daqueles que já se encontravam seguindo
Jesus. A multidão ordenava que se calassem, e mesmo assim eles clamavam com voz
ainda mais alta, até que foram ouvidos por Jesus, que os chamou para perto de
si e os curou, permitindo que passassem a enxergar.
Esses
cegos representam muitos que, embora já tenham ouvido falar sobre Jesus, já leram
o que a Bíblia ensina sobre Ele e creem que Ele é o Filho de Deus, ainda não
tiveram uma experiência pessoal com o Mestre, um encontro transformador que
possa lhes abrir os olhos espirituais para compreenderem com maior clareza as
verdades bíblicas.
Representam
pessoas que talvez congreguem em igrejas locais, participam dos cultos e demais
atividades, mas pode ser que tenham um conhecimento de Jesus baseado nas
experiências dos outros, e não na sua própria experiência.
Talvez
eles representem também aquelas pessoas que estão passando por situações de
grande aflição, que necessitam da ajuda de Jesus e se colocam em oração,
esperando que o Mestre ouça o clamor e venha prestar o socorro, e infelizmente
não contam com o apoio de outros nessa luta.
O fato é que esses dois cegos nos
ensinam que é necessário manter a fé, ainda
que as circunstâncias ao nosso redor sejam desfavoráveis, e ainda que pareça
impossível encontrar uma saída.
Eles
acreditavam que Jesus poderia curá-los e nem mesmo a oposição da multidão
abalou a sua fé. Eles continuaram crendo e a sua fé foi o combustível que os
levou a continuar buscando por Jesus.
Os
problemas, as dificuldades, as turbulências da vida não devem abalar nossa fé,
pelo contrário, devem nos conduzir a buscar ao Senhor com mais intensidade. A
atitude da multidão não abalou a fé dos dois cegos, mas eles continuaram
convictos de que Jesus podia transformar suas vidas.
A
reação correta diante das adversidades não é deixar de crer, mas é crer com
ainda maior firmeza, sabendo que nosso Senhor é poderoso para fazer o
impossível.
Os dois cegos também nos ensinam que é
essencial perseverar na oração. O
texto diz que quando a multidão tentou calar os cegos eles passaram a clamar
ainda mais, conforme versículo 31.
Diante
do grande ruído, das repreensões recebidas e da multidão que tentava abafar
suas vozes, os cegos não desanimaram, mas continuaram a clamar por Jesus,
crendo que seriam ouvidos, como de fato foram.
Nem
sempre nossas orações são respondidas de forma imediata e da maneira como
esperamos. Todavia, a perseverança na oração é uma atitude que o próprio Jesus
incentivava, e seus apóstolos, seguindo o mesmo ensinamento do Mestre, também
reafirmaram em suas lições aos cristãos, como Paulo ao escrever aos Romanos:
“Alegrem-se
na esperança, sejam pacientes na tribulação, perseverem na oração.” (Romanos 12:12)
Os
dois cegos foram perseverantes em seu clamor e sua fé foi recompensada com a
cura de sua cegueira. Quem espera no Senhor não é desamparado e não fica sem
resposta. Por isso, sejamos perseverantes na oração.
3)
JESUS CRISTO
O
terceiro e mais importante personagem dessa passagem é Jesus Cristo.
Jesus
ministrava lições por meio de suas palavras e também por suas atitudes. Pouco
antes Ele havia ensinado que os seus discípulos devem servir, assim como Ele
próprio veio para servir. Agora, ele mostra de forma prática o que havia
ensinado em palavras, servindo a duas pessoas que os outros provavelmente
consideravam indignas da presença do Mestre.
Jesus
manda que os dois mendigos cegos se aproximem e estabelece um diálogo com eles,
perguntando o que queriam que lhes fizesse. E após ouvir deles que desejavam
enxergar, o Mestre se encheu de compaixão e os curou, e imediatamente eles
passaram a segui-lo.
Jesus ensinou, com isto, que Ele não faz
acepção de pessoas, mas está disposto a
servir a quem clamar pelo seu nome, não importando a condição social ou
financeira. Diante de uma multidão que queria excluir os dois cegos e impedir
que chegassem até Jesus, o Mestre os acolheu. Ele serviu duas pessoas
miseráveis que não tinham como oferecer nada em troca, senão a gratidão e a
disposição de seguir o Senhor.
Portanto,
devemos ter essa consciência, de que Jesus não nos despreza por sermos meros
mortais pecadores, carregados de problemas, traumas e doenças físicas ou
espirituais.
Se
nos aproximarmos de Jesus com fé, como fizeram os dois cegos, certamente Ele
não nos rejeitará, pois Ele mesmo afirmou isso:
“Todo
aquele que o Pai me dá, esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo nenhum o
lançarei fora.” (João 6:37)
Jesus também nos ensina que seus ouvidos
estão sensíveis para ouvir nosso clamor,
e que mesmo em meio a todo o ruído ao nosso redor, mesmo com outras vozes se
levantando, Ele consegue nos ouvir e se volta para acudir ao que recorre a Ele
com fé.
A
multidão era grande e certamente o ruído era intenso. Eram muitas pessoas
falando ao mesmo tempo, de maneira que se tornava muito difícil, quase
impossível, diferenciar as vozes dos dois cegos clamando por Jesus. Suas vozes
eram abafadas pelo alvoroço da multidão. Talvez houvesse pessoas junto de Jesus
conversando com Ele, de maneira que realmente seria improvável que Ele
conseguisse ouvir os clamores de dois mendigos que estavam à beira do caminho e
nem tinham condições de acompanhar a multidão e ir ao encontro de Jesus sem que
alguém os ajudasse.
Mas
mesmo assim Jesus os ouviu e parou para conversar com eles.
Sim,
Jesus ouve nossa voz! Não importa o que esteja acontecendo ao redor, Ele ouve.
Mas não é pelo volume da nossa voz, e sim pela fé, pois esta é que toca o
coração de Jesus, assim como aconteceu com os dois cegos.
Portanto,
creiamos nessa verdade: ainda que não tenhamos força para clamar em alta voz, devido
ao enfraquecimento causado pela dor e o sofrimento, Jesus consegue ouvir a nossa
voz, e está pronto para vir em nosso socorro com muito amor.
CONCLUSÃO
Diante
do que o texto bíblico nos ensina, entendemos que é tempo de reafirmarmos nossa
fé em Jesus por meio de uma vida prática de amor e serviço ao próximo, atuando
como pontes entre as pessoas e Jesus, e jamais nos tornando empecilhos ao
relacionamento das pessoas com Cristo.
Também
cumpre lembrar que nossa fé em Jesus não é em vão, e que devemos perseverar na
oração, buscando a presença de Cristo continuamente, pois com Sua Presença vem,
consequentemente, tudo o que é necessário para vivermos de modo a glorificar a
Deus.
E
assim como fizeram os dois cegos, é essencial que demonstremos gratidão ao
nosso Senhor Jesus, seguindo-o com o coração cheio de amor, alegria e
sinceridade.
Há
muitas pessoas que precisam se achegar a Jesus, como os dois cegos de Jericó, mas
lhes falta uma ponte, alguém que as ajude, e a Igreja de Cristo tem essa
função, de servir às pessoas apresentando-lhes Jesus e dando-lhes suporte para
que possam caminhar com o Mestre.
Que
Deus nos capacite a cumprirmos nossa missão de forma digna.
José Vicente
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