Textos base: Salmos 42 e 43
Antes
de começarmos a falar sobre o abatimento da alma, é necessário termos ideia do
que vem a ser o abatimento. O dicionário[1]
apresenta os seguintes significados para a palavra:
“Enfraquecimento físico ou moral; depressão,
prostração. Perda ou redução da força física; enfraquecimento. Falta de vigor
moral; entristecimento.”
Percebe-se
que o abatimento é uma situação que atinge tanto a esfera psicológica como
física. Geralmente o estado de abatimento de uma pessoa é facilmente perceptível
em seu semblante (tristeza aparente, olhar desanimado), em sua postura corporal
(corpo encurvado, cabeça inclinada para baixo), em suas palavras (negatividade,
ausência de esperança, reclamação) e em suas atitudes (falta de ânimo para sair
ou para fazer qualquer coisa, abandono de planos, isolamento, etc.).
O
abatimento vem em diversos níveis, mas a situação é mais extrema quando
desemboca em uma depressão, com grande prostração, onde por vezes a pessoa
chega a perder até mesmo a vontade de viver.
Nos
Salmos 42 e 43, cuja leitura fizemos, podemos perceber que o seu autor também
atravessava um momento de grande abatimento. Isto pode ser visto com clareza no
Salmo 42, versículo 3, onde ele fala do seu choro constante; versículo 4, onde
ele rememora um tempo em que tinha alegria, mostrando que naquele momento
estava infeliz; versículos 5 e 11, onde de forma explícita ele, conversando
consigo mesmo, pergunta por que sua alma está abatida; versículo 6, em que o
salmista diz que sente a alma abatida; além de muitos outros versículos que
evidenciam a situação de tristeza, abatimento, de dor na alma.
O
abatimento não tem uma causa única, mas pode ser provocado por diversos fatores
que nos trazem aflição, tristeza, desilusão. No texto lido podemos ver que o
salmista fala em opressão de inimigos (v. 9-10, Salmo 42; v. 2, Salmo 43), em
nação contenciosa, homem injusto e fraudulento (v. 1, Salmo 43), em sofrimentos
que vêm como ondas de um mar bravio e passam sobre ele (v. 7, Salmo 42).
Segundo consta, o autor seria um levita que se encontrava exilado em uma
localidade de gentios, onde não tinha como ir ao templo adorar a Deus e sua fé
era alvo de zombaria.
Ao
longo de nossa vida, é bem provável que experimentemos alguns períodos de
abatimento. Uns provarão níveis mais profundos de abatimento, enquanto outros
passarão por suas formas mais leves, mas uma coisa é certa, todos nós estamos
sujeitos a nos sentir abatidos em dados momentos de nossa existência.
E
as causas são diversas: o peso de pecados não confessados; oposições; projetos
frustrados; doenças; perdas; falsas acusações; críticas; solidão; etc.
Analisando
os Salmos 42 e 43, podemos extrair algumas lições que nos auxiliarão nos
momentos em que nos sentirmos abatidos.
1)
Sentir abatimento não significa
falta de fé, mas nossa fé deve ser aperfeiçoada nesse período difícil
Infelizmente
existe um pensamento equivocado de que o crente não pode ter depressão, não
pode passar por períodos de abatimento, que deve constantemente estar de bem
com a vida, mesmo diante das maiores tribulações, deve caminhar sempre de forma
altaneira. Há uma perigosa “teologia do super-crente”.
Isto,
porém, não encontra amparo na Bíblia, pois ela, na verdade, revela a
fragilidade humana, evidenciando o quanto necessitamos da graça de Deus para
podermos superar as debilidades que possuímos.
Sentir-se
abatido, deprimido, desencorajado, é algo que pode acontecer tanto com o crente
como com o incrédulo. A diferença está na forma como cada qual lidará com a
situação, mas o fato de um crente ver-se abatido não significa que ele não
tenha fé.
Vemos
nesses Salmos que o seu autor estava passando por enorme tristeza, sentindo-se
extremamente abatido, todavia, há vários indicativos de sua fé no Altíssimo. Os
versos 1 e 2 do Salmo 42, por exemplo, mostram o anseio do salmista pela
presença de Deus. Os versos 5 e 11 revelam sua fé quando ele diz a sua alma
para esperar em Deus, afirmando que Deus é o seu auxílio. Já no Salmo 43
podemos citar o verso 1, onde o autor está recorrendo a Deus para pleitear a
sua causa. No verso 2 ele diz que Deus é sua fortaleza.
Podemos
dizer, portanto, que o salmista era um homem de fé, assim como Jó, que em meio
ao seu sofrimento sentiu-se muito abatido, mas manteve sua fé em Deus.
A
Bíblia nos permite saber que ao longo dos anos muitas pessoas tementes a Deus
foram acometidas de abatimento em variados níveis. Elias, por exemplo, após ser
instrumento de demonstração do poder de Deus contra os falsos profetas que
serviam ao rei Acabe e perante todo o povo de Israel, intimidou-se ao ser
ameaçado por Jezabel e retirou-se para longe, não sentindo ânimo nem coragem de
prosseguir em seu ministério profético. Ele só recobrou o ânimo após ser
tratado por Deus (1Reis 1-18).
O
abatimento que nos sobrevém não é uma demonstração de falta de fé, mas uma
consequência da nossa condição de seres humanos, pois infelizmente ainda não
atingimos a perfeição, que somente experimentaremos quando tivermos nosso corpo
glorificado e estivermos na Nova Jerusalém.
Enquanto
vivermos aqui, neste mundo, estamos sujeitos a enfermidades, tribulações, sofrimentos,
situações diversas que podem, sim, trazer à nossa alma um profundo abatimento,
uma sensação de que as portas estão fechadas para nós e ninguém está nos
ouvindo.
Observe-se
que o salmista estava tão abatido que chegou a pensar que Deus não o estava
escutando e talvez o tivesse rejeitado. No verso
9 do Salmo 42 o salmista diz: “Digo a Deus, rocha minha: Por que te
olvidaste de mim?”. Olvidar é esquecer. O salmista pergunta por que
Deus se esquecera dele. E no verso 2
do Salmo 43, assim ele se expressa: “Pois
tu és o Deus da minha fortaleza. Por que me rejeitas?”.
Deus
não havia se esquecido do salmista nem o rejeitara, mas a situação por ele
vivida era tão difícil, tão desesperadora, que em seu abatimento ele chegou a
pensar que Deus já não mais olhava para ele.
Por
certo muitos de nós já passamos por períodos de crise pessoal em que nos
sentimos profundamente tristes, abatidos, desanimados, e provavelmente já
chegamos a pensar, assim como o salmista, que Deus havia se esquecido de nós ou
estava nos rejeitando.
Mas
os questionamentos do salmista não significam uma falta ou perda da fé, e, sim,
o seu profundo desejo de ser amparado por Aquele em que ele continua crendo, o
Deus Todo Poderoso, mesma atitude que deve se fazer presente em nós quando
passarmos pelo sombrio vale do abatimento.
A
fé que uma vez foi implantada em nosso coração pelo próprio Deus continua ali
presente, e é por meio dela que vamos superar as situações de abatimento da
alma. É a nossa fé que vai fazer toda a diferença para que possamos sair da
crise e louvar a Deus com alegria, exaltando-o por mais um maravilhoso
livramento.
Jesus
nos deixou a seguinte palavra de encorajamento: “Tenho-vos dito isto, para que em
mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o
mundo.” (Jo 16.33)
Portanto,
quando estivermos em situações de abatimento, sentindo-nos tristes e
desanimados, lembremo-nos das promessas do nosso Mestre Jesus e nos apeguemos a
elas com fé, pois assim recobraremos o ânimo para caminhar e vencer com Cristo.
O
período difícil não deve ser um motivo para enfraquecermos na fé, mas, sim, um
instrumento para fortalecimento dessa fé, pois nunca devemos nos esquecer de
que nosso Deus é fiel e jamais vai nos desamparar.
Passar
por períodos de abatimento não é falta de fé, mas nesses momentos devemos rogar
ao Pai que fortaleça nossa fé, pois a fé é o elemento essencial para a cura e a
restauração da alegria em Deus.
2)
Em meio ao abatimento, devemos buscar
a Deus com mais intensidade
O
salmista encontrava-se imerso em um mar de sofrimento, e mais de uma vez ele
disse que sua alma estava abatida. A alegria havia fugido de seu coração e ele
chorava continuamente (v. 3, Salmo 42).
Entretanto,
mesmo nesse cenário de dor e sofrimento, o salmista não fugiu da presença de
Deus, ao contrário, ele intensificou sua busca pelo Altíssimo, manifestando
intenso desejo de adorar a Deus.
Isto
pode ser percebido quando lemos os versos 1 e 2, do Salmo 42, onde o salmista
expressa o seu anelo por Deus. Ele compara o seu anseio pela presença do
Altíssimo com a corça sedenta em busca de água, ou seja, como a água é
essencial à sobrevivência da corça, também Deus é imprescindível à
sobrevivência do salmista.
Assim,
ele deseja estar perto de Deus, adorá-lo, entoar-lhe louvores, pois sabe que
Deus é a fonte de todo o bem, e somente Deus tem o poder de mudar sua situação
e restaurar sua vida para que volte a ter alegria.
Infelizmente,
não raras vezes é possível encontrar irmãos que, ao passarem por crises que
levam ao abatimento, acabam por se afastar de Deus. Como em alguns casos lhes
faltam forças até para orar, vão deixando de lado seus ministérios, param de
frequentar as reuniões e os cultos da igreja, começam a se isolar.
Mas
não é bom que as coisas aconteçam dessa maneira. Nos momentos mais difíceis da
nossa vida devemos buscar a presença de Deus com maior intensidade do que
fazemos quando as coisas caminham bem. É nesses períodos de crise que a Bíblia
deve se tornar o nosso principal ou, talvez, único livro de leitura diária,
porque nela encontramos testemunhos de crentes que superaram tempos difíceis
pela fé em Deus, somos consolados pelas promessas do Altíssimo, somos
trabalhados pelo Espírito Santo para amadurecermos e voltarmos nossos olhos
para o Autor e consumador da nossa fé, Jesus Cristo:
“Olhando
para Jesus, autor e consumador da fé, o qual, pelo gozo que lhe estava
proposto, suportou a cruz, desprezando a afronta, e assentou-se à destra do
trono de Deus.” (Hebreus 12:2)
Quando
buscamos a Deus nossa perspectiva é alterada. A forma como enxergamos aquilo
que está nos abatendo se modifica. Começamos a compreender que conosco está
Aquele que é maior do que tudo, que tem o universo em suas mãos, que não
conhece o impossível, e nosso coração começa a recobrar o ânimo, a confiança, o
vigor, caminhando passo a passo para
fora da prisão que é o abatimento da alma.
O
salmista disse que Deus era sua rocha (v. 9, Salmo 42) e sua fortaleza (v. 2,
Salmo 43), ou seja, ele sabia que estando em Deus ele tinha estabilidade,
segurança, proteção, e isso lhe concedia força para acreditar numa mudança
daquela triste realidade.
Irmãos,
quando mais perto de Deus estivermos, mais rápido conseguiremos superar os
períodos de abatimento da alma. Por outro lado, se nos afastarmos dEle o tempo
de tristeza pode se prolongar, porque talvez nos vejamos tentando lutar
sozinhos, quando deveríamos segurar nas mãos de nosso Pai Celeste para fazer a
travessia de forma mais segura e rápida.
3)
Em meio ao abatimento, devemos
renovar nossa esperança no Senhor
Uma
das consequências do abatimento é a falta de perspectiva. Não se vê uma saída,
parece que a situação não terá fim e seremos consumidos pelo sofrimento. Manter
esse pensamento é o caminho para se aprofundar cada vez mais na condição de
prostração.
O
salmista, apesar de toda a angústia que sentia, ao buscar a presença de Deus
alimentou seu coração com a esperança de que o Altíssimo pleitearia a sua causa
e lhe traria restauração, enxergando dias melhores à frente. Ele sabia que,
confiando em Deus, não seria deixado naquela situação para sempre, mas o Pai
haveria de socorrê-lo e lhe devolver a alegria que havia se perdido.
A
esperança do salmista está registrada em vários versículos. No Salmo 42, verso 5, após questionar sua
alma sobre a causa de seu abatimento, ele diz: “Espera em Deus, pois ainda o
louvarei, a ele, meu auxílio e Deus meu.” Essa mesma afirmação é
repetida no verso 11.
No
Salmo 43 ele manifesta sua esperança nos versos 3 e 4: “3 Envia a tua luz e a tua
verdade, para que me guiem e me levem ao teu santo monte e aos teus
tabernáculos. 4 Então, irei ao altar de Deus, de Deus, que é a minha grande
alegria; ao som da harpa eu te louvarei, ó Deus, Deus meu.”
E
no verso 5 do Salmo 43, novamente ele repete: “Espera em Deus, pois ainda o
louvarei, a ele, meu auxílio e Deus meu.”
Esse
testemunho está registrado nas Escrituras para que também nós, ao passarmos por
épocas tormentosas que nos provoquem abatimento, nos apeguemos à esperança de
que nosso Deus está conosco, Ele não nos abandona e pode restaurar por completo
a nossa alegria, levantando-nos do pó e nos colocando em lugares elevados, bem
acima das tribulações, como está prometido na Sua Palavra:
“O
Senhor sustenta a todos os que caem, e levanta a todos os abatidos.” (Salmo
145.14)
“O
SENHOR abre os olhos aos cegos, o SENHOR levanta os abatidos, o SENHOR ama os
justos.” (Salmo 146.8)
"O pobre e o
necessitado buscam água, e não encontram! Suas línguas estão ressequidas de
sede. Mas eu, o Senhor, lhes responderei; eu, o Deus de Israel, não os
abandonarei.” (Isaias 41.17)
Aquele
que não crê em Deus se desespera de forma extrema ao passar por crises e
sofrimentos, pois seus olhos não veem saída nem solução, mas o que está firme
no SENHOR alimenta seu coração com a esperança que vem da fé nas promessas do
Altíssimo, e essa esperança permitirá que não desistamos, mas prossigamos rumo
ao cumprimento dos propósitos que Deus tem em nossas vidas.
CONCLUSÃO
A
alma abatida geralmente se sente cansada das lutas e dos desafios, e
sobrecarregada diante de um mundo adoecido e que cada dia mais impõe pesos
descomunais sobre as pessoas. Nosso
Senhor Jesus nos fez um convite que traz, em si, a promessa de refrigério:
“Vinde
a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei.
Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de
coração; e achareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o
meu fardo é leve.”
(Mateus 11.28-30)
Diante
de tão maravilhoso convite, a melhor resposta que podemos dar é aceitá-lo e
entregar a Jesus o que nos aflige, o que nos causa abatimento, a fim de que Ele
nos alivie de nosso pesado fardo e, na Sua Presença, experimentemos tempo de
descanso e alegria.
E
tendo conhecimento de tão maravilhosa graça, que sejamos instrumentos para
levar os abatidos à presença do Senhor Jesus, para que, assim como nós, que
temos em Cristo nossa firme esperança, também outros provem desse infinito amor
e sejam restaurados.
“Que
o Deus da esperança os encha de toda alegria e paz, por sua confiança nele,
para que vocês transbordem de esperança, pelo poder do Espírito Santo.” (Rm 15.13)
José
Vicente
21.07.2019
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