sexta-feira, 15 de março de 2024

Lições de Sodoma e Gomorra

 


Texto: Gênesis 19.1-17; 23-36

A narrativa da destruição de Sodoma e Gomorra é uma das mais conhecidas da Bíblia. O texto conta que, tendo Abraão recebido a visita de Deus e dois anjos em forma humana (uma teofania), foi alertado por Deus quanto à destruição de Sodoma e Gomorra devido à pecaminosidade exacerbada daquelas cidades.

Depois que Abraão indagou a Deus com relação à possibilidade de poupar as cidades caso encontrasse justos habitando nelas, os dois anjos foram enviados para cumprir a missão de destruição, mas antes deveriam retirar Ló e sua família para um lugar seguro.

Ló era sobrinho de Abraão e habitava em Sodoma, onde tinha seus negócios e mantinha sua família. Após uma aglomeração de pessoas mal intencionadas que pretendiam cometer abusos contra os homens que se hospedaram na casa de Ló, e que eram anjos em forma humana, veio a revelação de que a cidade seria destruída.

Essa história bíblica revela, em pleno período patriarcal, antes mesmo do advento da Lei que foi dada no Sinai por intermédio de Moisés, o Evangelho pré-anunciado em figuras que vamos analisar a partir de agora.

 

    1)    SODOMA E GOMORRA: A CONDENAÇÃO DO PECADO

Essas duas cidades eram cheias de corrupção, imoralidade sexual, com pessoas desprovidas de ética, sem lealdade, sem dignidade, afeitas à violência, sem amor, sem compaixão, sem os valores transmitidos por Deus ao Seu povo.

No texto vemos que os homens da cidade queriam abusar dos dois homens (anjos) que estavam hospedados na casa de Ló, e quando este tentou impedi-los, oferecendo as próprias filhas, os cidadãos de Sodoma se voltaram contra ele e disseram que fariam a ele pior do que aos dois hóspedes.(vv. 4-9).

Sodoma e Gomorra tipificam o mundo desprovido de valores morais e éticos, afastado de Deus, totalmente entregue à devassidão e à carnalidade. O pecado do povo dessas cidades era tão grave, que apenas os dois anjos foram até lá, enquanto o Senhor permaneceu com Abraão (Gn 18.22), pois Deus não contempla o pecado, mas estava à vontade na presença de Abraão.

Embora esses fatos tenham ocorrido milhares de anos atrás, podemos verificar que atualmente não há muita diferença no mundo em que vivemos, porque diariamente testemunhamos pelas mídias informativas e redes sociais, e às vezes pessoalmente, a maldade humana se espalhando, a falta de amor destruindo vidas, a imoralidade sexual sendo exposta e praticada aos olhos de todos, a corrupção tomando conta de todos os setores da sociedade, os valores morais e éticos jogados no lixo.

Nossa sociedade está cada vez mais egoísta, voltada para o que é supérfluo e passageiro, desprezando a Palavra de Deus dia após dia, vivendo como se não houvesse de prestar contas ao Altíssimo.

Na verdade, está se cumprindo o que Jesus afirmou em Mateus 24.12: “¹² E, por se multiplicar a maldade, o amor se esfriará de quase todos.”

O retrato do povo de Sodoma e Gomorra é muito parecido com o retrato do mundo da época de Paulo e o mundo atual, cabendo lembrar aqui as palavras de Paulo na Carta aos Romanos:

“²⁸ E, por haverem desprezado o conhecimento de Deus, o próprio Deus os entregou a um modo de pensar reprovável, para praticarem coisas que não convêm. ²⁹ Estão cheios de todo tipo de injustiça, perversidade, avareza e maldade. Estão cheios de inveja, homicídio, discórdia, engano e malícia. São difamadores,³⁰ caluniadores, inimigos de Deus, insolentes, arrogantes, orgulhosos, inventores de males, desobedientes aos pais,³¹ insensatos, desleais, sem afeição natural e sem misericórdia.³² Embora conheçam a sentença de Deus, de que os que praticam tais coisas são passíveis de morte, eles não somente as fazem, mas também aprovam os que as praticam.” Romanos 1:28-32

A destruição que sobreveio a Sodoma e Gomorra aponta para o juízo de Deus quando realizar o julgamento do mundo, o que ocorrerá na segunda vinda de Cristo. O destino daqueles que rejeitam a graça de Deus e abraçam o mundo é perecer, pois já estão condenados, assim como estavam condenados os habitantes de Sodoma e Gomorra devido à sua dureza de coração e apego ao pecado.

 

     2)    LÓ: O PECADOR QUE RECEBE GRAÇA

Ló era sobrinho de Abraão e, depois de um desentendimento com seu tio devido ao tamanho de seus rebanhos, optou por viver nas proximidades de Sodoma. Com o tempo, ele acabou fixando sua moradia na cidade de Sodoma, juntamente com sua família.

Ele estava vivendo em meio a um povo corrompido, e talvez já estivesse habituado a ver as práticas pecaminosas do povo com certa naturalidade. Ló estava tão familiarizado com aquela sociedade que suas duas filhas iriam se casar com homens de Sodoma (v. 14).

Então, é provável que a consciência de Ló estivesse cauterizada, não se incomodando com a maldade que imperava na cidade, com os costumes totalmente absurdos e contrários à vontade de Deus que eram adotados pelos moradores daquela localidade.

Ló representa o pecador que não tem mérito para escapar do juízo de Deus, mas que recebe graça por intermédio de outro: Abraão, que tipifica Jesus Cristo.

Toda a humanidade é representada por Ló, porque, como diz a Bíblia, “todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Romanos 3.23).

Quando Abraão perguntou a Deus se ele destruiria as cidades caso houvesse certas quantidades de justos no meio do povo, Deus disse que não destruiria. Abraão começou perguntando se houvesse cinquenta justos, e terminou com dez (Gn 18.24-33), entretanto, não havia nenhum justo em Sodoma e Gomorra, por isto a sentença de destruição foi mantida.

Significa que Ló não foi visto como justo, todavia, por causa de Abraão, Deus estendeu sua graça a Ló e sua família para que fossem salvos da destruição.

Ló é o nosso representante nesse episódio, porque, conforme nos ensina a Bíblia, nós não somos justos e não possuímos méritos que nos assegurem um lugar no Reino de Deus e livres da condenação. Não temos como salvar a nós mesmos. Não temos nada a apresentar diante de Deus para cancelar a sentença de condenação, por isso precisamos de um mediador, alguém que, sendo justo, estenda sobre nós a justificação e nos redima de nossos pecados.

 

     3)    ABRAÃO: TIPO DE CRISTO

Abraão foi chamado por Deus para que saísse de sua terra, da casa de seus pais, e fosse a um lugar que Deus lhe mostraria, e recebeu a promessa de ser pai de uma grande nação, vindo a ser um canal de bênção para todas as famílias da terra (Gn 12).

Ele mantinha comunhão com Deus, era obediente e fiel ao Senhor. A Bíblia afirma que ele foi chamado amigo de Deus (Tiago 2.23). Abraão também é chamado de pai da fé. Foi por sua fé autêntica que Abraão foi justificado sendo ainda incircunciso (Rom 4). Abraão procurava não ter aliança com pessoas que praticavam a impiedade, tendo inclusive recusado receber do rei de Sodoma, em certa ocasião, sua parte nos despojos quando voltou de uma batalha em que Deus lhe concedera vitória (Gn 14).

Foi por causa de Abraão que Deus salvou Ló (v. 29).

Abraão tipifica Jesus Cristo. Assim como Ló foi salvo da destruição porque Deus, lembrando-se de Abraão, estendeu graça sobre Ló, também nós somos salvos da ira vindoura por causa de Jesus Cristo.

Jesus é o mediador por meio de quem a graça de Deus se manifesta a nós. Pelos méritos de Jesus, que cumpriu integralmente a Lei de Deus e foi obediente até a morte na cruz, somos justificados e resgatados.

“⁵ Porquanto há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem,⁶ o qual a si mesmo se deu em resgate por todos: testemunho que se deve prestar em tempos oportunos.” 1 Timóteo 2:5,6

Não há outro caminho para que o ser humano escape da sentença de condenação, senão pela fé em Jesus Cristo, o Filho de Deus, que veio como homem ao mundo e morreu na cruz, mesmo sendo inocente, para com seu sangue nos limpar de todo pecado e nos apresentar purificados diante de Deus, garantindo-nos um lugar no Reino de Deus.

 

     4)    A FÉ: ESSENCIAL À SALVAÇÃO

Quando os anjos disseram a Ló para se preparar a fim de sair daquele lugar com sua família porque a cidade seria destruída por causa do pecado, Ló acreditou e foi tomar providências (Gn 19.13-14).

Os genros de Ló, porém, quando ouviram isso, acharam que se tratava de uma piada de Ló e não acreditaram, seguindo suas vidas normalmente.

Como resultado, Ló saiu da cidade com as filhas e a esposa, mas sem os genros, pois estes não creram. Os genros foram destruídos com o restante dos moradores, visto que não deram crédito à mensagem ouvida.

Da mesma forma que aqueles anjos anunciaram o juízo de Deus sobre Sodoma e Gomorra, hoje o Evangelho é pregado pela Igreja, que anuncia a segunda vinda de Cristo e o juízo de Deus sobre todo o mundo.

Há os que creem e buscam abrigo em Jesus, entregando suas vidas a Ele e sendo salvos, mas muitos veem isto como um conto de fadas, ficção, fanatismo religioso, e rejeitam a mensagem proclamada.

A incredulidade mantém as pessoas em sua condição de condenação, porque não creem em Jesus Cristo e na necessidade de conversão para que possam ter acesso ao Reino de Deus. Não creem que são pecadoras e que, ainda que façam boas obras, isso não é suficiente para lhes assegurar a salvação, que somente pode ser obtida por meio de Jesus Cristo, que com seu sangue pagou um alto preço pelo nosso resgate.

Assim, cumpre-se o que foi dito por Jesus:

“¹⁵ E disse-lhes: Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura.¹⁶ Quem crer e for batizado será salvo; quem, porém, não crer será condenado.” (Marcos 16:15,16)

É pela fé que a mensagem do Evangelho faz sentido para nós e recebemos a graça salvadora de Deus por meio de Jesus Cristo:

⁸ Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus;⁹ não de obras, para que ninguém se glorie.” (Efésios 2:8,9)

 

     5)    URGÊNCIA

Apesar de os anjos terem alertado para a iminente destruição de Sodoma e Gomorra, Ló demorou para sair da cidade, de maneira que os anjos pegaram a ele e sua família pela mão e os levaram para fora da localidade (v. 15-16).

O texto diz claramente que isso se deu pela misericórdia de Deus (v. 16). Uma vez que Ló estava se demorando, os anjos poderiam tê-lo deixado ali com sua família, partindo para o cumprimento de sua missão de destruir as cidades, mas Deus é misericordioso e fez com que os anjos dessem um empurrãozinho em Ló, de forma que ele e sua família saíssem logo.

Assim como é urgente anunciar o Evangelho ao mundo, também é urgente que as pessoas compreendam a mensagem e tomem a decisão que vai transformar suas vidas, no sentido de renunciar aos valores do mundo e buscar refúgio em Jesus Cristo, entregando sua vida a Ele.

Não sabemos quando ocorrerá a segunda vinda de Cristo, mas sabemos que pode acontecer a qualquer momento, quando ninguém estiver esperando, por isso não se pode deixar para amanhã a decisão de entregar sua vida a Jesus, pois nem mesmo sabemos se haverá um amanhã. Jesus pode voltar daqui a cem anos, dez anos, um ano, um mês, amanhã ou hoje mesmo, portanto, o dia para dar ouvidos à voz de Deus é hoje, como diz a Escritura:

“⁷ Assim, pois, como diz o Espírito Santo: Hoje, se ouvirdes a sua voz,⁸ não endureçais o vosso coração como foi na provocação, no dia da tentação no deserto” (Hebreus 3:7,8)

 

     6)    A MULHER DE LÓ: OS QUE RETROCEDEM

O versículo 26 diz que a mulher de Ló olhou para trás e se converteu em uma estátua de sal.

A expressão hebraica traduzida como “olhou para trás” tem o sentido de olhar com saudades, com desejo de voltar, de retroceder, retornar, e não apenas de olhar. Então, a mulher de Ló, quando já estava chegando à cidade de Zoar, onde estaria a salvo, sentiu o desejo de voltar para trás, de não se afastar de Sodoma e seu povo, e assim acabou perecendo.

Ela representa os que simpatizam com a mensagem do Evangelho, ou acreditam em um falso evangelho, em um Jesus criado conforme a idealização humana, mas não entregam sua vida a Jesus Cristo, e logo sentem vontade de voltar à velha vida, aos velhos hábitos pecaminosos que nunca saíram de seu coração.

Também representa aqueles que estão caminhando com o povo de Deus porque seguem alguém da família, mas seu coração está preso ao mundo e logo retrocedem. Pessoas que querem ficar com os pés em dois barcos, porque seu coração está preso às coisas mundanas.

Jesus confirmou que esse tipo de pessoa não entrará no Reino de Deus:

“⁶² Mas Jesus lhe replicou: Ninguém que, tendo posto a mão no arado, olha para trás é apto para o reino de Deus.” (Lucas 9:62)

Jesus está falando justamente das pessoas que, tendo iniciado a caminhada cristã, ficam presas à vida que tinham e retrocedem em vez de avançar.

O autor da Carta aos Hebreus, enfatizando essa verdade, afirma:

“³⁷ Porque, ainda dentro de pouco tempo, aquele que vem virá e não tardará;³⁸ todavia, o meu justo viverá pela fé; e: Se retroceder, nele não se compraz a minha alma.³⁹ Nós, porém, não somos dos que retrocedem para a perdição; somos, entretanto, da fé, para a conservação da alma.” (Hebreus 10:37-39)

Em 1985 foi lançado um filme que tinha o ator Jean-Claude Van Damme, e se intitulava “Retroceder nunca, render-se jamais”. Era um filme de artes marciais. O título do filme é bastante sugestivo e poderia ser adotado como um lema para a vida cristã.

Retroceder nunca! Sempre prosseguir em frente, rumo ao alvo, como Paulo afirma na Carta aos Filipenses:

“¹³ Irmãos, quanto a mim, não julgo havê-lo alcançado; mas uma coisa faço: esquecendo-me das coisas que para trás ficam e avançando para as que diante de mim estão,¹⁴ prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus.” (Filipenses 3:13,14)

Render-se jamais! Não se render ao pecado, às tentações, às investidas de Satanás, aos atrativos do mundo, mas resistir firmes na fé em Cristo.

“⁸ Sede sóbrios e vigilantes. O diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar;⁹ resisti-lhe firmes na fé, certos de que sofrimentos iguais aos vossos estão-se cumprindo na vossa irmandade espalhada pelo mundo.” (1 Pedro 5:8,9)

Ló e suas filhas chegaram à cidade de Zoar e foram salvos da destruição, porém a sua esposa, que retrocedeu, sofreu o juízo de Deus e pereceu.

 

CONCLUSÃO

No mundo sombrio e corrompido em que vivemos Deus nos chama para que nos refugiemos em Cristo, renunciando ao pecado e aos atrativos mortais que o mundo nos oferece, agindo com diligência e seguindo sempre em frente, firmes na fé, sem jamais vacilar ou retroceder.

Como Igreja, somos convocados a anunciar ao mundo que a segunda vinda de Cristo se aproxima, e que no Dia do Grande Juízo serão condenados todos aqueles que rejeitaram o Filho de Deus e a mensagem do Evangelho, tendo preferido abraçar o mundo e suas paixões infames.

O anúncio do Evangelho deve ser feito hoje, assim como hoje é necessário que cada pessoa creia em Jesus e se converta de seus maus caminhos, para que, no Dia do Juízo, esteja abrigada em Cristo e se cumpra o que foi dito por Jesus:

“²⁴ Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna, não entra em juízo, mas passou da morte para a vida.” (João 5:24)

E foi reafirmado pelo apóstolo Paulo:

“¹ Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus.” (Romanos 8:1)

Que a misericórdia de Deus seja derramada sobre nós e principalmente sobre aqueles que ainda não se renderam a Jesus, para que, enquanto ainda há tempo, ouçam a proclamação do Evangelho e creiam no Filho de Deus, para que tenham a vida eterna.

José Vicente

sábado, 9 de março de 2024

OS PERIGOS DA AVAREZA

 


Lucas 12.13-21

Segundo matéria divulgada no portal da CNN Brasil[1] (www.cnnbrasil.com.br), o número de milionários no Brasil subiu de 293 mil para 413 mil do ano 2021 para 2022. Considera-se milionário quem tem patrimônio acima de US$ 1 milhão. Já em termos globais, o número de milionários no mundo era de 59,4 milhões ao final do ano 2022.

Nas redes sociais e diversos canais de internet é comum nos depararmos com anúncios de especialistas se dispondo a nos fornecer ensinamentos para nos tornamos milionários. A quantidade de ofertas é bastante grande, cabendo lembrar também que há livros publicados com esse mesmo tema.

O sonho de ficar rico faz parte da vida de muitas pessoas. Algumas têm esperança de ficar ricas ganhando na loteria; outras acreditam que trabalhando arduamente conseguirão aumentar seu patrimônio até o ponto de serem consideradas ricas; há as pessoas que se dispõem a práticas ilícitas por causa do dinheiro; enfim, a riqueza é almejada e buscada por muita gente.

Em nome da acumulação de bens materiais, muitas pessoas abrem mão de coisas preciosas, como a convivência com a família, com os amigos, momentos de lazer, a comunhão com Deus, o descanso, o cuidado com a saúde, etc.

Na passagem lida, Jesus estava ensinando à multidão quando um homem veio até Ele pedindo que Ele fosse árbitro em partilha de herança. O homem queria receber sua parte em uma herança e sua intenção era que Jesus ordenasse ao outro herdeiro que fizesse a divisão (v. 13).

O assunto trazido pelo homem não tinha absolutamente nada a ver com o que Jesus estava ensinando. Ficou evidente que aquele homem não estava ali com interesse nas coisas celestiais, pelo contrário, sua cabeça estava voltada para bens terrenos. Sua preocupação com uma herança era suficiente para que ele interrompesse Jesus tentando que Ele resolvesse o seu problema financeiro com o irmão.

A resposta de Jesus foi curta e incisiva: “homem, quem me constituiu juiz ou partidor entre vós?” (v. 14). Jesus não permitiu que aquela conversa se prolongasse, mas tratou de deixar bem claro que Ele estava tratando de valores espirituais, e não de valores terrenos, e que as coisas deste mundo não podem receber mais atenção do que as coisas celestiais, porque são transitórias.

Jesus declarou que “a vida de um homem não consiste na abundância dos bens que ele possui” (v. 15), ou seja, quando o assunto é o Reino de Deus, nada importa a situação financeira do ser humano, pois o seu valor não é demonstrado pelo que possui, mas pelo que ele é e faz ao longo de sua existência.

Para ensinar ao homem e à multidão qual seria a visão correta de um discípulo de Cristo, Ele contou uma parábola sobre um homem rico que obteve uma grande produção em sua lavoura, mas que demonstrou uma atitude totalmente equivocada em relação à riqueza, algo que é reprovado por Deus.

Jesus usou a palavra avareza para designar o apego a bens materiais em detrimento de coisas mais importantes, como a vida espiritual. É comum associarmos a avareza à mesquinharia. Chamamos de pão-duro quem não abre a mão para dispor de algum dinheiro em favor de alguém ou que pratica uma economia que não permite nem mesmo a ele próprio desfrutar dos benefícios que sua situação patrimonial poderia lhe proporcionar.

O avarento tem amor ao dinheiro, aos bens materiais, e esse amor acaba sendo a raiz de todos os males, com o perigo de provocar um desvio da fé e trazer inúmeros sofrimentos, como nos adverte o apóstolo Paulo em 1 Timóteo 6.10.

De acordo com o ensino de Jesus, a avareza traz alguns perigos muito reais, conforme vamos destacar a seguir.

 

     1)    DESENVOLVE O EGOÍSMO E O EGOCENTRISMO

O homem da parábola era rico, porém a sua riqueza não o tornou uma pessoa melhor, pelo contrário, ele demonstrou ser um homem egoísta e egocêntrico. Tudo o que esse homem fala está na primeira pessoa: meus frutos, farei, destruirei, construirei, meu produto, meus bens, minha alma.

O texto diz que ele “arrazoava consigo mesmo”, ou seja, ele estava tendo uma conversa com ele próprio. E após conjecturar sobre o que faria para estocar toda a abundância da produção obtida, concluiu que poderia dizer a si mesmo: “descansa, come, bebe e regala-te”.

Tratava-se de um homem que já era rico, e diante da enorme produção em suas terras, acabou ficando ainda mais rico. Então, a sua preocupação passou a ser a forma de armazenar e desfrutar de tamanha abundância.

Não havia nenhum problema no fato de aquele homem ser rico, assim como não seria pecado que ele fizesse planos para desfrutar do resultado de seu trabalho. É bênção de Deus podermos prosperar e usufruir daquilo que nos foi permitido por Deus conquistar.

Entretanto, é interessante notar que em nenhum momento aquele homem proferiu uma palavra de gratidão a Deus pela bênção da abundante colheita. Não se vê da parte dele nenhuma atitude no sentido de louvar a Deus e reconhecer que se Deus não o tivesse abençoado enviando chuva e sol nas épocas apropriadas, a lavoura poderia até mesmo não produzir nada.

Ele também não demonstrou a intenção de abençoar outras pessoas por meio do compartilhamento, da solidariedade. Havia, certamente, pessoas necessitadas em Israel, órfãos, viúvas, enfermos, porém ele não cogitou utilizar seus recursos econômicos para ajudá-los, para aliviar seu sofrimento.

Infelizmente, a sua avareza o levou a ser ingrato e demonstrar amor aos bens, mas não ao próximo. Os bens se tornaram o deus dele, e ele se fechou em seu mundinho perfeito de abundância material, porém afastado de Deus e das pessoas.

Embora estejamos diante de uma parábola, ou seja, uma pequena narrativa utilizada por Jesus para transmitir lições que tinham como finalidade ensinar verdades do Reino de Deus, podemos constatar facilmente que as histórias contadas por Jesus encontravam e ainda encontram eco na realidade do ser humano.

Em nosso mundo é comum ver pessoas que, devido ao amor ao dinheiro e a bens materiais, têm seus valores invertidos, valorizando o que é transitório e que não contribui para o seu crescimento espiritual.

O acúmulo de bens materiais tem a capacidade de despertar o egoísmo e o egocentrismo no ser humano, como aconteceu com o homem da parábola. Então, passamos a conjugar os verbos sempre na primeira pessoa: eu.

Com isso, vem a ingratidão, porque, a exemplo do agricultor da parábola, não nos lembramos de agradecer a Deus pelas bênçãos, antes, ficamos focados em nós mesmos e julgamos que os bons resultados alcançados são fruto apenas de nossa capacidade e nossa aplicação.

E, fechados em nosso egoísmo, não nos dispomos a utilizar essas bênçãos para abençoar outras pessoas. Pensamos apenas em como aumentar nosso patrimônio e protegê-lo. Nossas preocupações passam a ser em relação à forma de gerenciar tudo o que conquistamos, de maneira que a cada dia nos tornamos mais avarentos, mais apegados aos bens materiais, crendo que isso nos torna pessoas mais valiosas.

Jesus disse que a vida de um ser humano não consiste na grande quantidade de bens que ele consegue acumular. Entretanto, contrariando essa palavra, muitas pessoas gastam suas vidas correndo atrás de riquezas, de poder econômico ou político, de posições sociais elevadas, enfim, coisas que não têm valor aos olhos de Deus.

A avareza faz com que percamos de vista o que é realmente precioso, e com isto, caminhamos sem gratidão, esquecemos de Deus e ignoramos nosso próximo, justamente o que a Bíblia nos ensina a não fazer.

Na seção seguinte do texto Jesus vai dizer aos seus discípulos que devem buscar em primeiro lugar o Reino de Deus, não se preocupando com as coisas materiais, porque estas seriam acrescentadas pelo Altíssimo, que conhece todas as nossas necessidades. E Jesus conclui dizendo que “onde está o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração” (v. 22-34).

 

     2)    LEVA A NÃO CONSIDERAR O TEMPO E A MORTE

O que deveria ser uma bênção acabou se tornando um motivo de pecado. Diante de tanta fartura, aquele homem esqueceu que o ser humano é frágil e transitório, estando sujeito à morte. Ele também não considerou que ninguém conhece o tempo de sua morte, e que isso pode acontecer a qualquer momento, independente da idade da pessoa.

Com a ilusão de que teria muito tempo, ele passou a planejar que aquela produção extraordinária lhe garantiria sustento e tranquilidade por muitos anos. Ele imaginou que a riqueza o tornaria uma pessoa imune à passagem do tempo e à morte, e que não lhe sobreviria nenhum mal.

Isto pode ser visto no versículo 19: “¹⁹ Então, direi à minha alma: tens em depósito muitos bens para muitos anos”.

O homem da parábola estava envolto na ilusão de que seu grande patrimônio lhe traria segurança. Sua situação era a mesma descrita em Provérbio 18.11, que assim diz:

“¹¹ Os bens do rico lhe são cidade forte e, segundo imagina, uma alta muralha” (Provérbios 18:11)

E é exatamente assim que muitas pessoas pensam ainda hoje. Acreditam que a conquista de bens materiais lhes trará segurança, estabilidade, imunidade, superioridade, e que estarão completas, nada mais precisando.

Há os que desperdiçam suas vidas correndo atrás de riquezas. E quanto mais conseguem mais ainda desejam, como está dito em Eclesiastes 5.10: “¹⁰ Quem ama o dinheiro jamais dele se farta; e quem ama a abundância nunca se farta da renda; também isto é vaidade.” Eclesiastes 5:10

Pessoas assim perdem oportunidades valiosas de estar na presença de Deus, de usufruir de momentos alegres com seus familiares, de compartilhar experiências gratificantes com seus amigos, porque estão muito ocupadas amealhando bens.

Então Jesus quebra essa falsa expectativa com a afirmação de que “esta noite será pedida tua alma, e o que tens preparado, para quem será?” (v. 20). A Bíblia na versão King James Atualizada apresenta esse texto da seguinte forma:

“Contudo, Deus lhe afirmou: ‘Tolo! Esta mesma noite arrebatarei a tua alma. E todos os bens que tens entesourado para quem ficarão?’”

Jesus está deixando claro que nossa vida nesta terra não está sob nosso controle. Não temos a menor ideia de quantos anos viveremos, e nem mesmo se teremos um novo dia pela frente. Somente Deus tem o poder de nos manter vivos e de nos tomar deste mundo, e não recebemos um aviso prévio indicando qual será esse momento, pode ocorrer a qualquer tempo, quando menos estivermos esperando.

O homem da parábola estava em seu pleno vigor, fazendo planos futuros, mas Deus não fazia parte desses planos. Então, Deus disse que arrebataria a sua alma naquela mesma noite, e que tudo pelo que ele havia dedicado o melhor de sua vida ficaria para trás, não teria mais nenhum valor para ele.

Essa palavra deve nos levar a uma reflexão sobre a forma como temos conduzido nossas vidas. Deus nos presenteou com um corpo, com vida, saúde, condições de trabalhar e obter nosso sustento, família, descanso, momentos de lazer, capacidade de aprender e crescer, e principalmente nos concede a possibilidade de nos relacionarmos com Ele por meio de Jesus Cristo, experimentando um viver que vai na contramão dos valores deste mundo e que é capaz de nos tornar pessoas melhores, mais parecidas com Jesus, cheias de amor e aptas a impactar positivamente a vida de nossos semelhantes.

Precisamos ter sempre em mente essa verdade: nossa vida não pertence a nós, mas a Deus, e ele a toma de volta quando quiser. Deus não nos colocou neste mundo para sermos meros acumuladores, mas para vivermos de tal forma que Ele seja reconhecido e glorificado pelo mundo. Em vez de gastarmos nosso tempo correndo atrás do que é passageiro, devemos nos concentrar em desfrutar  do que Deus nos oferece, sendo sempre gratos ao Altíssimo pelo seu cuidado para conosco.  

 

     3)    FAZ ESQUECER QUE É NECESSÁRIO SER RICO PARA COM DEUS

Jesus concluiu sua parábola afirmando que é necessário ser rico para com Deus, em vez de buscar acumular riquezas deste mundo.

Ele disse isso em outra ocasião, conforme registrado em Mateus 6.19-21:

“¹⁹ — Não acumulem tesouros sobre a terra, onde as traças e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam; ²⁰ mas ajuntem tesouros no céu, onde as traças e a ferrugem não corroem, e onde ladrões não escavam, nem roubam. ²¹ Porque, onde estiver o seu tesouro, aí estará também o seu coração.” Mateus 6:19-21

Ser rico para com Deus e ajuntar tesouros no céu são a mesma coisa. A resposta está na sequência de Lucas 12, versículos 22-34, onde Jesus afirma que é necessário buscar em primeiro lugar o Reino de Deus.

Ajuntar tesouros no céu é ter as coisas celestiais como prioridade. É buscar a vontade de Deus acima da nossa. É viver com a consciência de que nossa existência não se resume a conquistas terrenas, mas deve servir para abençoar o nosso próximo, levar o conhecimento de Deus a quem ainda o desconhece, praticar o amor e a misericórdia, caminhar conforme os valores do Reino.

Como já dissemos, não é pecado ter bens materiais, dinheiro, pois isso pode vir como bênção de Deus para nossas vidas. A Bíblia registra servos de Deus que foram muito ricos, como Abraão, Jó, Davi, Salomão, etc. Suas riquezas foram fruto do agir de Deus, que os fazia prosperar e lhes proporcionava mais do que o necessário para que pudessem ter vida farta.

O grande problema está em se esquecer de Deus e mergulhar no relacionamento exclusivo com os bens materiais. Jesus disse claramente que não há possibilidade de servir às riquezas e a Deus, conforme narrado por Lucas:

“¹³ Nenhum servo pode servir a dois senhores; porque irá odiar um e amar o outro ou irá se dedicar a um e desprezar o outro. Vocês não podem servir a Deus e à riqueza.” Lucas 16:13

O homem da parábola estava servindo à riqueza. Ele não usava os recursos financeiros para atender às suas necessidades e do próximo, mas era um escravo de seu patrimônio, tornando-se egoísta e egocêntrico. Com isto, ele não tinha como servir a Deus, e, na verdade, talvez ele nem cogitasse em fazer isso, porque em nenhum momento ele menciona Deus enquanto está exultando com a enorme produtividade da lavoura e fazendo seu planejamento para o futuro.

Então, a parábola retrata muito bem a situação de uma pessoa que serve ao dinheiro, que tem o seu coração nas coisas materiais e não no Reino de Deus: ela se esquece de Deus, e passa a viver sem Ele.

E o fim de alguém que vive sem Deus é morrer sem Deus, algo extremamente triste e eternamente irremediável.

Por esta razão, enquanto Deus nos concede vida, devemos vivê-la como servos de Deus e não como escravos dos bens materiais, aproveitando nosso tempo para fazer o melhor em favor do nosso próximo e para buscar o aprimoramento espiritual, seguindo os ensinos de Jesus Cristo e amando a Deus em primeiro lugar.

Diferente daquele homem que, em meio à multidão que ouvia ensinamentos espirituais de Jesus, estava preocupado com a herança a receber, a nós cabe estarmos sempre sintonizados com Jesus, concentrados de todo nosso ser em seus ensinos e na prática de Sua Palavra.

Assim, seremos ricos para com Deus.

 

CONCLUSÃO

Embora o mundo valorize de forma extrema as riquezas materiais e ensine as pessoas a fazerem o que for necessário para amealhar patrimônio, Jesus Cristo vem nos ensinar a andar em sentido oposto, tendo a compreensão de que este mundo e tudo o que nela há vai passar, e que inclusive nós temos um tempo curto aqui na terra, que não deve ser desperdiçado correndo atrás do que é efêmero.

A Igreja de Cristo deve caminhar de forma diferente, mostrando ao mundo que não é escrava dos bens materiais, mas serva de Cristo.

Valorizemos o que realmente importa: o Reino de Deus, nosso relacionamento com o Altíssimo, os presentes que Ele nos dá nesta vida, como nossa saúde, nossa família, nossos amigos, nossos irmãos na fé.

A Bíblia nos ensina que todo ser humano um dia terá a sua existência neste mundo cessada. Importará saber o que fizemos nesse tempo que o Senhor nos permitiu viver aqui. Como utilizamos nossos recursos espirituais, que são os dons recebidos do Espírito. E que uso fizemos dos recursos materiais que Deus nos proporcionou? Apenas os acumulamos ou utilizamos para abençoar outras vidas?

Que o Altíssimo nos dê sabedoria e capacidade para fazermos o que é certo e conforme os ensinos do Mestre Jesus.

José Vicente

28.1.2024


[1] https://www.cnnbrasil.com.br/economia/numero-de-milionarios-dobra-no-brasil-em-um-ano-e-chega-a-413-mil-mostra-relatorio/